A austeridade na era ‘mediamacro’
Texto: JOÃO FERNANDES
Por vezes é preciso pensar fora da “caixa”. No caso da situação económica portuguesa, um ponto de vista particularmente privilegiado pode ser encontrado atravessando o canal da Mancha e lendo a análise das políticas económicas por lá aplicadas nos últimos anos.
Por um lado o Reino Unido está definitivamente fora da “caixa” Zona Euro, e ao mesmo tempo dentro da “caixa” Centros Financeiros Mundiais (tão longe fica a City dos periféricos países do sul da Europa), por outro, está certamente dentro dos países que seguiram políticas de austeridade depois da crise da dívida grega e está também dentro do barco europeu com Portugal, por muito que não queiram.
Por isso recomendo a leitura atenta do texto de Simon Wren-Leis, onde analisa os motivos que levaram à adopção de políticas de austeridade no bloco europeu e os seus danos na recuperação económica do Reino Unido, procurando responder à seguinte pergunta : “Como pode uma política que faz tão pouco sentido para os economistas passar a ser vista como uma inevitabilidade?”
Um ponto essencial do seu argumento é a constatação de que que os meios de comunicação social veiculam uma versão deturpada das teorias macroeconómicas, apresentando algo que Simon Wren-Lewis chama de “Mediamacro”. É na visão da “mediamacro” que mitos criados a partir de meias-verdades florescem e analogias são esticadas ao ponto do absurdo; por exemplo, entre o comportamento de um indivíduo e de um governo, quando se diz muitas,muitas vezes a frase “viver acima das nossas possibilidades”, referindo-se ao crescimento da dívida pública. Também é na “mediamacro” que as preocupações dos mercados financeiros adquirem exagerada importância,e geram, em particular, a obsessão com o défice que domina o espaço de noticiário.
Trata-se de uma crítica contundente aos media, que podem ser manipuláveis não apenas às mãos de políticos desonestos que se recusam a admitir que as políticas de austeridade foram prejudiciais para a recuperação económica do país (relembro que se está a falar do Reino Unido e de George Osborne), mas também às mãos de economistas ligados ao sector financeiro e não especialistas em política macroeconómica, que têm necessidades obviamente reduzidas quando comparadas com a gestão das finanças de um país.
O texto vale a pena ser lido na totalidade também por explicar de forma particularmente clara como o pânico da dívida grega levou à austeridade generalizada vivida em toda a Europa, o papel do Banco Central Europeu na gestão da crise e as alterações dos pontos de vista do Fundo Monetário Internacional sobre políticas de estímulo e austeridade desde 2009 até ao presente.
Podem ler aqui o texto, no site da London Review of Books

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