Pensar a pop, à maneira de 2015
Texto: NUNO GALOPIM
Não houvesse que ter em conta factor sorte, assim também como a forma como ela se conjuga com os contextos, os timings dos lançamentos (e do que acontece nos seus arredores) e também a força (favorável ou contrária) das opiniões, e o novo álbum de Dan Deacon tinha tudo para ser um dos casos sérios de 2015. Entre álbuns e EPs, entre trabalhos para cinema, nos caminhos da música contemporânea ou nas arenas da cultura pop, a sua obra soma já doze anos de atividade, cabendo ao novo Gliss Riffer uma clareza nas ideias e uma arrumação e orientação dos caminhos e das formas que, mais que nunca, fazem de um álbum seu um acepipe com capacidade para seduzir para lá do espaço mais cerrado onde entre experiências, a gestão de ruídos e liberdades, fez muita da discografia que até aqui apresentara.
Havia já sinais de uma vontade em encaminhar as ideias no anterior America, editado em 2012, assinando um promissor início de um relacionamento com a Domino. Porém, ao invés de dar um novo passo no mesmo sentido, ao caminhar para Gliss Riffer Dan Deacon resolveu antes focar atenções numa certa luminosidade pop, a mesma com que Panda Bear tem abençoado aos seus discos a solo desse Person Pitch e que tão bem levou depois ao universo dos Animal Collective em Merriweather Post Pavillion (cada vez mais o disco de referencia da primeira década do presente século).
Sem ter de olhar para os destinos dominantes do panorama pop do nosso tempo, o que Dan Deacon faz neste seu novo disco é antes a procura de uma ordem pop para as suas composições entre as quais há ainda camadas de acontecimentos, níveis de fontes de som e sonoridades de genéticas aparentemente imiscíveis. A arte de as juntar num corpo uno e bem arrumado deve-se a uma estruturação dos vários elementos – da voz à instrumentação, sem esquecer a inevitável noção de cenário – segundo uma matriz de canção pop, com resultados particularmente evidentes em momentos maiores como os que escutamos em Feel The Lightning ou Learning To Relax, havendo outros momentos, de maior libertação de energias e entusiasmos, com o por exemplo Sheathed Wings onde, mesmo assim, uma certa contenção impede que a dispersão se instale e uma cerca ordem pop – visível sobretudo na pujança melódica – prevaleça. O disco vinca também o talhar de um trabalho vocal que, se por um lado parece procurar a integração do canto entre o quadro instrumental, por outro não deixa por meias tintas as palavras que convoca às letras que se cantam.
Gliss Riffer é um disco feito de luz e cor. Doce até quando, por exemplo, em Meme Generator, quase cita as soluções açucaradas que Moby tantas vezes persegue, promovendo por outro lado, no trabalho de manipulação vocal, uma herança (ou uma simples coincidência de soluções) face ao que Jean Michel Jarre em tempos nos mostrou em Zoolook.
À sua maneira, está aqui um grande disco pop. Que Dan Deacon tenha a sorte de haver quem mais assim pense e note que mora aqui uma alma na linha da frente da eterna reinvenção dessa que é ainda a célula essencial da música popular: a canção.
“Gliss Riffer”
Dan Deacon
CD e LP Domino Records / Popstock
4 / 5

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