O Acordo Ortográfico visto do outro lado da fronteira
Texto: JOÃO FERNANDES
O assunto não poderia ser menos relevante na prática para os leitores e falantes da língua espanhola, no entanto, devido à enorme controvérsia em torno da sua adoção, a história das guerras da língua acabou por ir parar às páginas de um dos jornais de maior circulação do país vizinho.
Para quem procura uma vista neutral e desinteressado da polémica sobre a nova grafia, o primeiro artigo de que aqui damos conta será provavelmente o melhor ponto de partida, e talvez também o de chegada. Porque quando já tanto foi dito sobre os méritos e falhas do Acordo Ortográfico, o melhor será ler o quanto menos possível.
A história é clara, a de uma língua separada pelo Atlântico e com duas faces distintas desde 1911, e desde então não foram poucas as tentativas de as unificar nem pequenas as dificuldades de quem o tentava fazer. Por isso, como dá conta o artigo do El País, para os autores do acordo, a sua adoção é um grande êxito. Contudo, quando olhando para os números, o triunfo torna-se anti-climático: apenas 1.6% das palavras do português europeu e 0.5% das palavras do português brasileiro irão mudar; antes do acordo 96% do léxico português era igual em qualquer ponto do mundo lusófono, depois do acordo este número subirá para 98%. É claro que isto não retira nenhum mérito às intenções de unificar a língua portuguesa.
Numa coluna, o artigo enumera exemplos da mudança mais contestada, a perda das consoantes mudas. É curioso observar que na língua espanhola, muitas dessas consoantes também existem,sendo escritas deste e daquele lado da fronteira da mesma maneira, com a diferença de que não são mudas, por isso parecerá uma mudança mais chocante para os leitores de espanhol.
O segundo artigo para o qual se chama a atenção é uma entrevista a Salvador Gutiérrez Ordóñez, responsável por coordenar a mais recente revisão da ortografia espanhola. Conta como o processo foi muito mais pacífico do que o caso português. Mesmo espalhada por 22 academias diferentes, a língua espanhola manteve, desde 1815, a sua ortografia praticamente fixada e unificada. Vale a pena ler para saber a sua opinião sobre a reforma da língua portuguesa, a sua necessidade e as dificuldades que enfrenta.
Sobretudo sublinho a sua última resposta, em que afirma que “as reformas se fazem pouco a pouco”, e que a discussão parte dos cidadãos que apresentam às academias os seus problemas.

Deixe um comentário