Últimas notícias

Róisín Murphy no labirinto lounge

Texto: ANDRÉ LOPES

Tendo criado dois dos discos pop mais interessantes da primeira década do séc. XXI, Róisín Murphy regressa agora aos registos de longa-duração, disposta a não repetir fórmulas.

Tanto Ruby Blue como Overpowered foram mais que suficientes para assinalar a forma criativa que Róisín Murphy escolheu para vincar os caminhos para a sua linguagem depois do fim dos Moloko. Se com o primeiro disco a solo é possível escutar uma forma interessante de pensar e conjugar a pop eletrónica com as nuances experimentais de outros horizontes, no segundo Rósin viu na pista de dança um possível terreno fértil a explorar. Desde então, singles como Orally Fixated, Momma’s Place, Demon Lover e Simulation, deixaram clara a sua inclinação para talhar a sua música de acordo com uma noção bastante plástica do que poderá ser a música house, sem que nunca prossiga por uma rota distanciada de ideias melódicas e apelativas.

Há um ano Róisín Murphy lançava Mi Senti, um disco de versões de clássicos da música italiana, re-imaginados de acordo com sugestões minimalistas e que de certo modo fazem recordar alguns dos momentos em que os Moloko mais se deixaram influenciaram pelo trip-hop. Esse acabou por ser um disco que não atraiu muitas atenções, mas no qual foi possível ouvir uma mudança flagrante na música de Róisín, com uma maior atenção dada aos detalhes da produção e uma preferência por ritmos menos frenéticos, nos quais as melodias respiram mais facilmente. É esse o ponto de partida para Hairless Toys.

Recuperando ideias rítmicas do italo disco, o alinhamento do novo álbum de Roísín Murphy abre com Gone Fishing, uma recordação livre de Paris is Burning, o documentário icónico de Jennie Livingston sobre a cena drag nova-iorquina. Porém, nunca em Hairless Toys nos cruzamos como extravagâncias equiparáveis às do filme. Pelo contrário, a peculiaridade do álbum reside precisamente no tónus introspetivo do som. Evil Eyes reconvoca os sintetizadores e Exploitation trabalha com ritmos mais agitados. Ainda assim todas as faixas do disco encontram o seu caminho para alcançar uma estimulação que terá mais de mental do que propriamente física. A balada Exile recorre ao dramatismo da guitarra elétrica para conceber um momento que tem tanto de único como de atípico. A dança ficará para segundo plano perante este conjunto de canções, onde a elegância não permite estridências maiores.

Não será exatamente o regresso esperado por muitos dos seus admiradores, contudo Róisín Murphy sublinha o seu interesse num total controlo artístico ao dar prioridade àquilo com que se identifica, tal como acontecera com Tales of Us, o disco onde encontrámos os Goldfrapp apaixonados pela melancolia. Hairless Toys é igualmente ciente de si próprio, ainda que mais convidativo: está é uma obra que desvaloriza qualquer sentido de urgência, propondo antes uma audição imersiva, rica em detalhes e preciosismos rítmicos incomuns na pop contemporânea.

Róisín Murphy
“Hairless Toys”
PIAS Recordings
4/5

Deixe um comentário