Shamir causa tumulto
Texto: ANDRÉ LOPES
Partilha a editora com nomes como FKA Twigs ou The Horrors e, com 20 anos de idade, Shamir assina já – após um EP lançado em 2014 – um dos discos de estreia mais interessantes dos últimos tempos. Escrito em parceria com o produtor Nick Sylvester, Ratchet é o disco no qual assume o lugar que quer ter na música contemporânea bem como a voz com que o pretende alcançar.
Vindo de Las Vegas, Shamir declara um interesse particular por música country, algo que de resto não será evidente para quem se cruze com Ratchet, onde (à exceção da faixa bónus KC) encontramos a energia de um jovem artista cercado de uma série de influências que, conjugadas, garantem uma robusta versatilidade a este conjunto de canções. Muito do que aqui se escuta é reminiscente dos trabalhos de bandas como os Hercules & Love Affair ou LCD Soundsystem – projetos que partilharam o selo da DFA Recordings, e o gosto da mesma por repensar a aliança entre as formas e normas pop/rock e a música de dança. Numa química flagrante entre os ritmos da house e as melodias eletrizantes da pop eletrónica atual, Ratchet tem uma particularidade que o diferencia dos demais lançamentos que tentaram, incessantemente, revigorar o poder da pista de dança. O registo vocal de contratenor de Shamir faz dele o intérprete nato para canções que, mais do que ritmos acesos, requerem algo que a cenários diversificados.
Vegas e Make a Scene, as duas primeiras faixas do álbum, apresentam desde cedo a voz de Shamir como peça chave de um alinhamento eclético, algo já típico de álbuns de artistas que optam pela experimentação ao invés da insistência em fórmulas de sucessos anteriores. On the Regular, o single que em 2014 serviu de sinal do que estaria para vir, traz a linguagem e cadência do rap para uma faixa muitas vezes equiparada a 212 de Azealia Banks. Algo que não será descabido, já que ambas as canções partilham da mesma energia jovial e um frenesim de ambição, que se fazem ouvir a cada verso debitado do modo mais energético possível.
Darker retira o protagonismo da caixa de ritmos e confia numa harmonia notável entre a voz e as ambiências dos sintetizadores, no momento do disco que garante uma pausa para respirar e para enfim, contemplar o modo como a música não necessita de fulgor constante para cumprir aquilo a que se propõe aqui: com ou sem dança, trata-se fundamentalmente de um processo de comunicação sobre os receios e inquietações de um jovem recém-chegado à indústria da música.
Mais que uma recuperação de tendências de dança que se viram com novo fulgor durante a primeira década do séc. XIX, Ratchet é a declaração de interesses de uma figura inesperada, de contornos queer, que parece não ter muito a perder. E isso agrada a quem ouve.
Shamir
“Ratchet”
XL Recordings
4 / 5

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