Christopher Lee (1922-2015)
Texto: NUNO GALOPIM
Para os mais velhos será sempre o Conde Drácula ou o implacável Scaramanga, um dos mais icónicos vilões que James Bond teve de enfrentar (no filme 007 – O Homem da Pistola Dourada). Para os mais novos será certamente Saruman (do universo de filmes criados a partir dos livros de Tolkien) e também o Conde Dooku, da segunda trilogia da saga Star Wars. Para todos era uma presença imponente, sublinhada sobretudo por uma voz grave e poderosa, com a qual cantou e chegou mesmo a gravar discos. Este domingo, aos 93 anos, Christopher Lee deixou-nos (a notícia só hoje foi divulgada).
De berço londrino, Christopher Lee nasceu em 1922 em Belgravia, filho de um oficial do exército britânico e de uma condessa de ascendência italiana. Fruto de laços familiares, a dada altura passou a ter Ian Flemming (o criador de James Bond) como primo. Falhou por um lugar (e má prova de aptidão a matemática) uma colocação em Eton, mas aos 17 anos, e depois de uma sucessão de passagens por vários colégios, a morte do padrasto e a dívida que então assombrou a família obrigaram-no a mudar de vida. De férias em França ainda nesse ano assistiu, em Versalhes, à última execução pública por guilhotina.
Durante a II Guerra Mundial começou por se voluntariar para defender a Finlândia, acabando mais tarde integrado nas forças britânicas, tendo agido em vários focos do conflito, entre os quais a célebre batalha de Montecassino, em Itália.
Finda a guerra, escuta entre as sugestões a hipótese de trabalhar como ator. Afinal havia um cantor de ópera na sua ascendência e a ideia agradou-lhe. Começou por receber narizes torcidos à sua elevada estatura. Mas em 1947 estreou-se no filme de Terence Young Corridor of Mirrors, que desde logo o colocava sob atmosfera gótica.
Dez anos depois o seu primeiro momento de impacte global chega quando veste a pele de Frankenstein (ao lado de Peter Cushing), em The Curse of Frankenstein, de Terence Fischer. Um ano depois interpreta pela primeira vez o mais célebre vampiro da história em Drácula, do mesmo realizador. Apesar das memórias míticas do Nosferatu criado por Max Schreck ou do Drácula que Bela Lugosi interpretada em 1931 para Todd Browning, a performance de Christopher Lee impôs-se e deste fez um dos mais importais papéis da história do cinema de terror. Retomaria o papel várias vezes, a ele acabando ligado de forma tão intensa que talvez só a breve passagem pelo universo de 007, em 1974, lhe deu, como Francisco Scaramanga, um papel capaz de se destacar para além do Drácula que filme após filme ajudou a construir.
Em 1977 mudou-se para os EUA, assinando vários papéis em inúmeros filmes. Mas só retomaria um estatuto de grande impacte global quando Peter Jackson o chamou para interpretar o mago Saruman na trilogia O Senhor dos Anéis, retomando depois o papel em O Hobbit. George Lucas chamou-o para interpretar o Conde Dooku nos filmes 2 e 3 da saga Star Wars. E Tim Burton, um admirador seu, chamou-o várias vezes, como em A Lenda do Cavaleiro sem Cabeça, Sweeney Todd ou Charlie e a Fábrica de Chocolate. Um dos seus últimos papéis num filme de grande impacte surgiu em Hugo, de Martin Scorsese.
Menos conhecida do que a sua carreira como ator, a obra de Christopher Lee na música começou bem mais tarde e ligou-o sobretudo aos universos do heavy metal. O mais célebre – e marcante – dos seus discos é: By the Sword and the Cross (2010), que conheceu sequela em Charlemage: The Omens of Death (2013) num registo metal sinfónico.
Entre os muitos mitos que se foram contando à volta deste ator que vestiu ainda a pele de Sherlock Holmes, Fu-Manchu e que achava que o melhor filme em que participara fora The Wicker Man (de Robin Hardy, 1973), um deles o próprio chegou a comentar, deixando claro que não tinha em casa uma extensa biblioteca de livros satânicos.

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