Quem te ouviu e quem te ouve
Texto: DANIEL BARRADAS
Em 2011, Active Child (nome de trabalho do músico Pat Grossi), lançou o seu album de estreia You are all I see que foi bem recebido nos Estados Unidos mas passou relativamente despercebido na Europa. Vale a pena ir à sua procura porque era uma bela colecção de canções e uma refrescante mistura de sintetizadores e harpa, com a voz em falsete de Grossi a dar-nos vontade de voltar a ouvir There must be an angel dos Eurythmics (descobrindo assim que Annie Lennox cantava num registo muito mais grave, mesmo quando se lançava aos agudos). Há alguma uma etiqueta chamada “80’s angel pop”? Se há, colem-na aqui.
O disco tinha excelentes momentos pop, o melhor dos quais, Hanging on, viria a ser re-interpretado em 2014 pela britânica Ellie Gouding na sequência da sua colaboração em 2013 no EP Rapor de Active Child. Dá satisfação comparar as duas versões porque confirma o que já sabíamos: que uma verdadeira harpa e um verdadeiro falsete e valem muito mais que um sintetizador manhoso e um auto-tune.
Chega-nos agora o segundo álbum, Mercy, que embora não deixe de ser um excelente cartão de apresentação para quem ainda não conhece a banda, fica uns furos abaixo do primeiro. Isto nada tem a ver eventual quebra na qualidade da escrita musical de Grossi, nem com a produção que até é muito mais (talvez até demais) cuidada. Deve-se simplesmente a uma inflexão no universo de influencias musicais. Obviamente ainda estamos a assistir ao impacto que o álbum de estreia de James Blake (curiosamente, do mesmo ano da estreia de Active Child) teve sobre o R&B e electrónica subsequentes. A ornamentação e vibratos soul que agora aparecem na voz de Pat Grossi e alguma “afectação electrónica” nos arranjos parecem desnecessários a quem ouviu o primeiro álbum. Estão bem feitos, estão, mas parecem coisa da moda.
É certo que Never far away não deixa de ser uma excelente canção só porque vai muito bem com um martini à beira da piscina, ensanduichado numa playlist entre uma Sade e um Brian Ferry, mas não era bem para aí que estávamos à espera que isto fosse (não digo “descambasse” porque dou muito valor a uma Sade à beira da piscina).
Mas ouça-se Darling para notar como arranjos simples fazem muito mais por uma sólida canção (e aquela harpa, bendito seja). Preste-se atenção à segunda metade do álbum, que abre com o belo instrumental Midnight swim que sim, vai bem com mergulho na piscina à meia-noite (lá me tramei com aquela comparação no parágrafo de cima) mas não é da mesma playlist. É aqui que se acham algumas das melhores canções do disco em Stanger e Lazarus.
No geral, este é um disco que passa a prova difícil do segundo álbum mas nos deixa vagamente apreensivos quanto ao que se poderá seguir na carreira da banda. Até lá, não se preocupem e desfrutem-no bem com aquele martini.
Active Child
“Mercy”
Vagrant Records 2015
3 / 5

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