Sol para o inverno
Texto: DANIEL BARRADAS
O modelo “pop com orquestra” já nos deu grandes discos, como os de Tori Amos ou dos Pet Shop Boys, grandes concertos como os da tournée de John Grant no ano passado, mas em geral, isto de vestir cançõezinhas pop com orquestras não é coisa com que se brinque de ânimo leve.
Bror Forsgren, embora se apresente pela primeira vez com Narcissus, não é exactamente um principiante e já tem atrás de si uma longa carreira nas bandas The Lionheart Brothers e Jaga Jazzist.
Forsgren disse em entrevistas que a sua inspiração foram os primeiros álbuns de Scott Walker e as suas luxuriantes orquestrações, mas a verdade é que se desviou bastante desses ambientes sombrios e acabou mais próximo de Colin Blunstone e Brian Wilson. O que só lhe fez bem, porque a sua voz aguda e as melodias simples adequam-se muito mais a esse lado solarengo da canção dos anos 60/70.
Há algo de verdadeiramente apetitoso neste disco que sai quatro meses tarde demais porque teria sido a melhor banda sonora para o verão que já passou. O lado aparentemente ingénuo da composição das canções e a leveza vocal é compensado por uma engenhosidade de orquestração capaz de conjugar violinos, harpas e trompetes com orgãos, baterias e guitarras em distorção, sem nunca soar a mistura forçada. Como se os instrumentos do rock sempre tivessem feito parte da orquestra clássica. Note-se em Still in the wild como a bateria e a distorção da guitarra entram e saem naturalmente e respiram o mesmo ar rarefeito que a harpa e as flautas, servindo no final como tapete perfeito onde montar uma escalada épica de trompetes e sinos.
Narcissus é sem vergonha nenhuma, um disco apaixonado por si mesmo. E Bror Forsgren é um artista que, logo na sua primeira noite no circo, sobe lá acima ao arame e, sem medo, se põe às cambalhotas. Que não caia, é o milagre. Ao público, só resta aplaudir pela audácia.
“Narcissus”
Bror Forsgren
Jansen Plateproduksjon, 2015
4 / 5

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