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E assim foi o By:Larm 2016

Texto: DANIEL BARRADAS, em Oslo

Oslo acolheu mais um festival By:larm, o South by Southwest da escandinávia, onde uma série de concertos, conferências e cerimónias de prémios junta todos os anos os mais diversos profissionais da música.

3 de Março

Para o público em geral, os três dias de concertos com mais de 200 artistas são uma oportunidade de auscultar talento em potencial e também fazer comparações com veteranos que são também convidados a participar.
Este ano por exemplo, o festival conta com participações de Anneli Drecker, El perro del mar, Nils Bech e Niki and the Dove.

Embora nos últimos dois anos o festival tenha passado de Fevereiro para Março a fim de evitar as ruas escorregadias com gelo que tornavam a estafeta de concertos numa verdadeira corrida de obstáculos, este ano a neve resolveu voltar ao evento. Oslo está coberta de branco e os passeios escorregadios com gelo.

A cidade enche-se de músicos e no centro estamos sempre a ver alguém com uma guitarra às costas.

O festival começa à quarta-feira com uma sessão de aquecimento a que assistem principalmente os delegados. Como de costume, os concertos dessa noite são menos que memoráveis. Assisti a dois que me pareciam mais interessantes (os americanos Whitney e o rapper norueguês Oscar Blesson) mas não tendo ficado grandemente interessado resolvi voltar a casa e guardar as energias para os dias seguintes.

O que aprendi nos meus cinco anos de festival é que é essencial fazer um bom trabalho de casa para o desfrutar como deve ser. Escolher os artistas que nos interessam (há de tudo: metal, rap, jazz, pop, electrónica…), perceber quais são as melhores salas para os ver e fazer um plano para a noite que considere o percurso que nos leva a saltitar de sala em sala, já que nos dias como mais público, chegar 15 minutos antes de uma actuação pode não ser o suficiente para conseguir entrar para a ver.

Dia 1

Niki & the Dove
O verdadeiro dia um começou então para mim com os suecos Niki & the Dove, no minúsculo palco do bar Internasjonalen. A banda está prestes a lançar o seu segundo álbum e começou a actuação precisamente como dois novos temas, que não sendo especialmente entusiasmantes são exemplos da perfeição pop a que já nos habituámos nos Suecos. A vocalista junta à sua excelente voz um arsenal de efeitos que gere entre dois microfones. O terceiro tema foi uma etérea versão do seu êxito DJ ease my mind que descamba numa jam entre a vocalista e o teclista que acaba por ser cortada repentinamente quando este se apercebe que só tem meia-hora de actuação. Cortam então para uma entusiasmante versão de um tema dos Talking Heads.
O que fica desta curta atuação é a percepção de que esta é uma sólida banda ao vivo, mais interessante talvez ao vivo do que em disco.

Mette Henriette
A sensação do momento da cena jazz da Noruega é a jovem saxofonista Mette Henriette, assinada recentemente pela editora ECM e cujo disco de estreia foi elegido pelo Guardian como o melhor disco jazz de 2015. E não há duvidas de que todos os elogios são justificados. Desde os primeiros minutos é evidente o virtuosismo de Mette, que explora todas as possibilidades sonoras do seu instrumento, em peças que se aproximam constantemente do silêncio. Acompanhada em palco por uma violoncelista, um pianista e um DJ (ou alguém que manipula sons gravados e electrónicos), o seu concerto foi um momento de verdadeira excelência musical.

Pale Honey
Este grupo sueco era uma das novas bandas que me despertavam maior interesse. O seu auto-intitulado álbum de estreia foi um dos meus favoritos do ano passado. Ao vivo, na pequena sala do bar Mono, o duo inicial de raparigas incluía mais um baixista. O seu som, seco, directo, muito 90s (pensem em Elastica, Nirvana) resulta extremamente bem ao vivo. O público obviamente não as conhecia, mas no final do concerto estão conquistados.

Lowly
Uma das novas bandas da editora Bella Union fica sem dúvida bem no seu ramalhete. Estes dinamarqueses contam com duas raparigas nas partes vocais e fazem um concerto coeso e decidido. O som estava talvez alto demais, o que fez com que alguns pormenores sonoros se perdessem na nuvem de distorção que se criava regularmente. Musicalmente, podiam beneficiar de melodias mais distintas, mas são sem dúvidas uma banda a ter em atenção no futuro.

Como de costume, este festival dá-nos oportunidade de provar concertos das mais diversas bandas. Neste primeiro dia passei por mais alguns que achei ligeiramente interessantes em disco mas que ao vivo acabaram por se revelar irrelevantes entre eles os noruegueses Ary, DePresno e os dinamarqueses Blaue Blume.

Dia 2

Holly Macve
O meu segundo dia de festival começou logo às 18h00 no bar Mono, com a pequena sala apenas meio cheia para ouvir uma das recentes contratações da editora Bella Union, prestes a editar o seu primeiro álbum. A britânica canta um country americano com vocalizações bem próximas das de Paula Frazer dos Tarnation. Eu já a tinha ouvido na primeira parte de um concerto de John Grant, mas aqui, num sitio mais pequeno e sossegado, as suas histórias/canções funcionaram muito melhor. Apesar de depois de três canções, tudo começar a soar ao mesmo, é inegável a qualidade da sua voz e intensidade das sua letras. Um talento a seguir.

Susanna
Susanna desde que se separou da sua Magic Orchestra tem seguido cada vez mais pelo seu caminho individual. Veio ao festival apresentar temas do seu próximo álbum que em termos de orquestração são bastante interessantes já que Susanna está rodeada de excelentes músicos. No entanto, temas que talvez pedem interpretações mais viscerais tornam-se quase cerebrais e não chega a ter o impacto que talvez pudessem ter.

Pale Honey
Uma segunda oportunidade para ver esta banda sueca, desta vez na sala grande do Rockefeller. Mais uma vez se confirma o grande potencial que têm. Quando aprenderem a soltar-se mais e a interagir com o público têm tudo para serem grandes.

Chinah
Na lotada sala do Gamla, tive a oportunidade de ver os dinamarqueses Chinah que praticam uma pop super-polida que impressiona pela qualidade do som que conseguem ter ao vivo (mesmo em condições longe do ideal). Mas são canções relativamente “esquecíveis”.

Liima
De volta ao Rockefeller para ver uma das novas bandas da editora 4AD. Os Liima incluem três antigos membros dos entretanto extintos Efterklang (incluindo vocalista) no entanto não são exactamente uma descendência directa e têm claramente um outro projecto musical. Assente essencialmente em electrónicas, deram um concerto fulgurante, ao mesmo tempo dançável, entusiamante e desafiador. Sem dúvida um dos melhores de todo o festival.

Johanan
Esta banda sueca, repleta de hipsters, mistura vários estilos e dá um concerto verdadeiramente simpático que deixa o público a sorrir. Felizmente não se levam muito a sério. Mas apesar das tenras idades são já músicos de qualidade. É a descobrir bandas destas que se sente o verdadeiro propósito deste festival. Citando o vocalista: “Sigam-nos no instagram, temos três imagens lá! O Facebook é mais recente, fizemos a página ontem.”

El Perro del Mar
A sueca El Perro del Mar regressa depois de um hiato de três anos. Veio apresentar canções do novo álbum que é uma completa reinvenção do que fazia até agora. Profundamente influenciada pela pop asiática, a sua sonoridade e harmonias estão embebidas em orientalismos. No entanto não perdeu a sua capacidade de descobrir refrões contagiantes e espremê-los por tudo o que podem dar. Acompanhada por uma banda vestida de branco como se estivesse a fugir de um culto e ela própria com vestes muito… hum… singulares… deu um bom concerto que, infelizmente, sofreu com as más condições de som da tenda principal do festival. Sem dúvida algo a ver de novo quando houver melhor som.

Dia 3

Johanan
Por mero acaso, volto a repetir o concerto destes suecos, desta vez no bar Internasjonalen. Com um palco maior que já lhes permite instalar a parafernália toda e mexerem-se em palco, dão uma versão muito melhorada do que vira ontem à noite. E afinal são uma banda de dois vocalistas! O som está perfeito e a banda com ainda melhor humor.

Lafawndah
Esta artista iraniana tem um dos projectos mais interessantes que apareceram nesta edição do festival. Usa electrónicas secas e angulosas como base para canções baseadas no modo de cantar do médio oriente mas com letras em inglês. O resultado é bem interessante, mesmo que ocasionalmente desconcertante pela novidade. Infelizmente apresentou-se sozinha em palco, mas deu bem conta do momento quase karaoke com uma excelente presença física. Recomendo o seu recém-lançado EP Tan, mas ao vivo as canções ganham muito mais intensidade, graças à interpretações da artista.

Nils Bech
Este artista norueguês aproveitou o festival para apresentar em primeira mão alguns temas do seu quarto álbum que lançará este ano. Pela amostra, vem aí o seu melhor disco! E isto é dizer muito já que Look Inside foi o meu álbum favorito de 2012. Apresentando-se acompanhado por dois DJ fez mais uma das suas “performances” já que cada um dos seus concertos é sempre acompanhado de uma dose de dramatismo em que ele faz uso dos seus dotes de bailarino e artista plástico. Paradoxalmente, a sua música está ainda mais electrónica e ainda mais operática. Se há comparações a fazer, é reconhecer-lhe um ocasional piscar de olha a Klaus Nomi. Casa cheia e público rendido desde o início.

Pixx
Outra das novas contratações da 4AD, Pixx é uma jovem britânica que faz um pop/rock de melodias ondulantes. Não impressionou especialmente o público que estava longe de preencher metade do bar Uhørt e as condições sonoras também não a ajudaram. Teve o seu momento alto no final com uma canção que nos lembrou os Smiths o que pode ser bom augúrio para o futuro

Kentaur
O RnB deste dinamarquês deixa-me um pouco indeciso. No seu EP de 2015 abria com a parolice de Arms of the infinite (experimentem ver o teledisco) mas terminava com a excelente e reflexiva Found in space. Ao vivo, no palco grande do Rockefeller apresentou-se com uma banda extremamente competente e demonstrou que a sua voz consegue ser um portento. As canções foram todas atmosféricas e com crescendos de intensidade que souberam bem incorporar o violino, o trompete e o saxofone. Infelizmente, talvez por ser o terceiro dia e o fim da noite, passei mais tempo a bocejar do que a bater palmas. Aguardemos para ver em que direcção segue a carreira de Kentaur. Por enquanto parece-me balançar entre o talento e a banalidade.

No geral, foi para mim um belo festival, este ano talvez com menos gente do que o costume, o que para mim foi bom porque não me aconteceu ter de ficar de fora de concertos que queria ver. Como momentos altos fica a memória dos concertos de Nils Bech, Liima, Pale Honey e Mette Henriette. Recomendo vivamente que descubram a sua música e que não os percam ao vivo, se tiverem essa oportunidade.

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