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É preciso estarmos atentos aos veteranos

Texto: NUNO GALOPIM

Trinta anos depois do magnífico “Graceland” Paul Simon apresenta em “Stranger to Stranger” um álbum que, com esse disco e com “The Rhythm of Saints” completa um trio de momentos maiores na sua obra a solo.

Paul Simon's new album, Stranger to Stranger, is out now.

Por direta associação de ideias é natural que liguemos Paul Simon aos universos da canção com ascendência folk. Da (notável) parceria que manteve com Art Garfunkel entre os sessentas e a chegada dos setentas a uma série de expressões que foi registando em discos em nome próprio, essas heranças cruzam a sua obra. Foi porém quando alargou a geografia dos sons a outros instrumentos (e lugares) que a sua música mais brilhou. Aconteceu ainda com Garfunkel quando teve em Bookends o disco de horizontes instrumentalmente mais desafiantes da obra da dupla. E depois, a solo, quando entre Graceland (1986) e The Rhythm of the Saints (1990) assinalou passos que não só contribuíram para uma visibilidade maior (na cultura pop ocidental) de músicas oriundas de outras paragens – nomeadamente da África do Sul e do Brasil – assinou os dois melhores capítulos da sua obra discográfica em nome próprio. E como não há duas sem três eis que, com o novo Stranger to Stranger não só nos dá o seu melhor disco em 30 anos, como com ele completa esse par de álbuns inesquecíveis com um disco que com ambos contrasta por não procurar ligações a um lugar e a uma cultura, partilhando contudo o interesse e gosto na exploração de instrumentos que olham para lá do universo que habitualmente tem ao seu redor.

Fruto de alguns anos de trabalho, Stranger to Stranger é um disco feito de canções que tomam as características tímbricas dos instrumentos como peças tão importantes quanto a composição, letra e interpretação. E por isso Paul Simon recorreu a alguns (muitos) colaboradores, entre eles Harry Partch, musicólogo e construtor de instrumentos. Numa lista (extensa) de músicos chamados a estúdio, os créditos do álbum revelam ainda presenças como as de Cristiano Cristi – um DJ e produtor italiano que assina como Clap! Clap! – ou de Nico Muhly, que assina arranjos e toca diversos instrumentos.

Sem expressar claramente nem uma geografia nem um tempo, sendo contudo um disco do nosso aqui e agora, Stranger to Stranger alia a escrita sólida (e bem reconhecível) de um veterano que há muito nos mostrou que sabe escrever canções e uma voz de qualidades igualmente reconhecidas a um percurso de descobertas onde as electrónicas convivem com percussões sul-americanas, metais e ecos africanos. Um mundo de acontecimentos, que chamou novamente o trabalho de um velho colaborador: o engenheiro de som e produtor veterano Roy Halee, que fora determinante tanto na captação do som de estúdio nos tempos da parceria com Art Garfunkel e, mais tarde, elemento chave para garantir unidade à abertura do som das canções à variedade de cores e sons dos instrumentos e vozes de Graceland e The Rhythm of the Saints.

O novo disco de Paul Simon (neste momento com 74 anos) é, ainda, mais uma expressão de grande forma de um veterano, juntando-se assim a títulos editados nos últimos tempos por figuras como Bob Dylan, Paul McCartney ou David Bowie (no seu disco de despedida), que nos lembram que não é só nas descobertas feitas entre os novos clubes, pistas de dança e college radios que mora o talento mais inventivo do presente. Há que contar com os veteranos.

Paul Simon
“Stranger to Stranger”
Concord / Universal
★★★★★

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