O filme de Christopher Nolan que quase ninguém conhece
Se bem que já prenúncio de um talento ímpar, as origens de Christopher Nolan no cinema estão bem longe das dimensões “colossais” de filmes como Cavaleiro das Trevas (2008), A Origem (2010) ou Interstellar (2014). Na base do lançamento da sua carreira, e após estudos de literatura e várias curtas, encontramos um filme de 70 minutos, a preto e branco, com atores desconhecidos e um orçamento ínfimo. Intitula-se Following (1998), e precede Memento (2000), o thriller com Guy Pearce no papel de um homem sem memória de curto prazo que se tornou objeto de culto e que, pelo seu cunho independente, talvez não fizesse adivinhar logo ali a robustez da futura obra do realizador. A primeira longa-metragem de Nolan é também um título de culto e muito pouco conhecido fora de um certo nicho de cinéfilos garimpeiros.
Com filiação no filme noir, Following acompanha os passos de um jovem escritor solitário que, para iludir o tédio da sua vida, resolve começar a seguir pessoas anónimas na rua sem que elas deem por isso. O objetivo inicial, ou assim nos quer fazer crer o protagonista, talvez numa racionalização das suas obsessões, é recolher material e inspiração para construir personagens. Pelo menos esse seria o intuito primordial, antes de se tornar “irresistível” ser um “seguidor” (uma espécie de irmão pós-moderno do flâneur baudelairiano – ou uma versão obscura do flâneur de Edmund White) e o jogo ver quebrada a sua regra essencial de seguir aleatoriamente alguém… Até que um dos “seguidos” se apercebe da situação, confronta o aspirante a escritor com o seu comportamento (chega a perguntar-lhe se ele é gay, mas este já explicara não se tratar de uma “coisa sexual”) e revela-lhe também uma faceta imprevista…
Following podia ter sido escrito por um Paul Auster, por exemplo. Porém, alguma crítica viu nele também um cruzamento entre David Mamet e Jean-Luc Godard. Do ponto de vista temático, o argumento de Nolan cifra-se num thriller negro com twist “psicológico”. No aspeto formal, a montagem, em mosaico cronológico, prefigura já a estrutura não linear de Memento. Mas depois de se ver Following a questão que fica a pairar é esta: “Alguém adivinharia o que se seguiria no percurso de Nolan, hoje um realizador com um “poderio” técnico e orçamental “mastodôntico”, a partir de um pequeno filme de culto, se bem que já carregado de sinais de talento, com uma discreta minoria de “seguidores”?” – Nuno Carvalho
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