Cinquenta sombras de marketing
Texto: JOÃO LOPES
Não creio que seja muito pertinente — culturalmente pertinente, quero eu dizer — assumir uma atitude de demonização de um filme como As Cinquenta Sombras de Grey. Afinal de contas, estamos apenas perante uma banalíssima variação sobre um modelo simplista e requentado de “erotismo” cuja sistematização ocorreu há quase trinta anos, com Nove Semanas e Meia (1986). Dito de outro modo: com mais ou menos perversões, algemas e outros gadgets, vogamos no interior da mais vistosa e anódina estética publicitária, penosamente esticada de um spot de 30 segundos para uma longa-metragem de duas intermináveis horas.
Seria francamente mais importante — politicamente importante, quero eu dizer — perguntar como e porquê um objecto tão medíocre consegue tantos e tão delirantes ecos mediáticos. A primeira resposta está, obviamente, no marketing global que sustenta o filme e no seu imenso poder normativo. A segunda tem a ver com todos nós e com o modo como permitimos que esse marketing se infiltre nos mais pequenos detalhes do nosso quotidiano.
De facto, não há, aqui, nenhum pensamento que justifique contraponto. Acontece apenas que, desde a imprensa cor-de-rosa aos espaços mais medíocres das redes sociais, o marketing sabe insinuar-se e instalar-se como se fosse um discurso “universal”. Pretender discutir a complexidade de qualquer forma de sexualidade a partir de As Cinquenta Sombras de Grey equivaleria a explicar a construção de uma nave espacial dirigida a Júpiter a partir da arte de dobrar uma folha A4 para fazer um avião. O certo é que, por estes dias, pronunciar os nomes de Christian Grey e Anastasia Steele parece equivaler a um tratado sobre a alma humana… Tempos difíceis.
A questão de fundo nem sequer é sexual — não é, pelo menos, de raiz sexual. Decorre do facto de, nas nossas sociedades de comunicação “instantânea”, vivermos rodeados de aparatos de infantilização, precisamente como o marketing de As Cinquenta Sombras de Grey, sendo incapazes (ou reduzidos a uma situação de incapacidade) para colocar questões adultas a propósito de temas adultos.
Resta saber o que faz no meio de tudo isto uma pessoa tão talentosa como Sam Taylor-Johnson que, antes deste filme, assinara o magnífico Nowhere Boy (2009), sobre a juventude de John Lennon. É caso para dizer: that’s another story…
“As Cinquenta Sombras de Grey”: 3*
Recentemente vi “As Cinquenta Sombras de Grey” e não é tão mau como o pintam, eu gostei do que vi. O livro é mais aprofundado, mas o filme vê-se bem.
Gostei do que vi em “Fifty Shades of Grey” e recomendo, mesmo não sendo tão bom quanto o livro. O filme emana sensualidade, mas falta sexo e nudez.
Cumprimentos, Frederico Daniel.
GostarLiked by 1 person