Uma festa pop sem voz por perto
Texto: NUNO GALOPIM
Sintetizadores, guitarras e sem voz por perto… Assim se tem feito a música dos Ratatat, dupla – constituída por Evan Mast e Mark Stroud – que se estreou em disco em 2003 com o single Seventeen Years, ao qual se seguiu no ano seguinte o álbum de estreia a que chamaram, muito simplesmente, Ratatat. Com um pé nos circuitos mais arty de Nova Iorque e um outro a ajudar o piscar de olho aos trilhos habituais em terreno da cultura pop, foram a primeira banda a atuar no Museu Guggenheim e ao longo dos anos assinaram remisturas para músicas de Björk ou The Knife. Há cinco anos que não nos davam a ouvir nova música. E convenhamos que a sucessão de álbuns menores que revelaram entre LP3 e LP4, respetivamente de 2008 e 2010, destinara atenções rumo a outros lados… Após uma pausa assinalam um regresso em Magnifique. E mesmo não repetindo os patamares de surpresa e encanto do álbum de estreia ou do sucessor Classics (de 2006), o disco representa um recentrar de ideias no núcleo da sua identidade. E com uma mão-cheia de bons momentos.
Para mergulhar neste universo é preciso ter sentido de humor ou pelo menos não viver naquela insegurança ignorante do receio de não estar a ouvir a música “certa” (coisa que naturalmente não existe, já que cada um tem o seu gosto e andar em rebanho só é bom para as ovelhas). Os Ratatat exploram mesmo algumas formas que podem soar azeite a jorros, sobretudo quando as guitarras evocam uns Queen (quantas vezes dou por mim a lembrar-me do álbum com a banda sonora de Flash Gordon, o mais atípico e surpreendente do grupo) ou um Mike Oldfield na fase anos 70… Mas depois há todo um repensar destas referências – e sobretudo sonoridades – num contexto que alia esse gosto na revisitação, desses ecos de 70 e alguma cor de 80, à construção de uma música que não deixa de ser contemporânea e que reflete, acima de tudo, um gosto gourmet pelo labor meticuloso que, através da produção, define as formas finais destes temas instrumentais.
Entre as faixas de Magnifique, onde tanto encontramos breves vinhetas experimentais e peças de pura alma pop (algumas sem esconder o gosto pela dança e festa) sente-se um prazer retro – não confundir com nostálgico – por formas e sons dos setentas, sobretudo naquela etapa em que as guitarras aceitaram começar a andar de mãos dadas com os sintetizadores. Há um certo cerrar de acontecimentos num espectro não muito vasto de acontecimentos e alguma exaustão instala-se a dois terços do alinhamento, que é todavia salvo por uma boa reta final na qual surge uma versão de I Will Return, single de 1971 do projeto Springwater.
Magnifique soa ao que poderia ter sido o caminho para um sucessor de Phrases for the Young, o belo disco de estreia a solo de Julian Casablancas (que representa o mais interessante dos títulos nascidos em terreno Strokes nos últimos anos)… Mas dispensa a voz. E nalguns momentos, como em Cream or Chrome ou Abrasive, dá-nos temas que farão bela banda sonora para as noites deste verão.
PS. A capa do álbum, tal como o teledisco de Abrasive, vivem de desenhos assinados pelo próprio Evan Mast.
“Magnifique” dos Ratatat foi editado em LP e CD pela XL Recordings e está disponível nas plataformas digitais de download e streaming.
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