Corridas nas pistas da história
Texto: NUNO GALOPIM
O veterano belga Marvano, cuja obra passou já por diversas vezes por espaços associados à II Guerra Mundial (quer nas séries La Brigade Juive ou Berlin) apresenta em Grand Prix um outro mergulho por histórias associadas ao III Reich mostrando como o universo das corridas de automóveis pode ser terreno para aventuras com um relacionamento com o contexto histórico e político que lhes serve de cenário, colocando-se assim numa grelha de partida que não quer necessariamente correr contra o veterano Michel e os demais carros e pilotos da Vaillante (cujo testemunho Jean Graton passou há poucos anos para as mãos do seu filho).
Grand Prix, série originalmente publicada em três volumes lançados entre 2010 e 2012, narra acontecimentos ocorridos entre 1933 e 39 (ou seja entre a chegada de Hitler ao poder e o eclodir da II Guerra Mundial), com um breve prólogo que remonta a 1925. Entre factos (e personagens reais) e uma trama de ficção que dilui outras figuras e acontecimentos entre o rumo dos acontecimentos que a história registou, Grand Prix evoca a aposta alemã nas corridas de automóveis como forma de demonstrar uma supremacia na tecnologia e no desporto definida pela propaganda do Reich.
Acompanhamos assim o salto técnico e competitivo que viveram as equipas da Auto Union e, sobretudo, Mercedes, cujos vitoriosos Flechas de Prata aqui tiveram a sua primeira vida, tornando campeões nomes como os de Rufolf Caracciola (campeão europeu em 1935, 37 e 38) ou Bernd Ronsenmeyer (em 1936).
O traço límpido de Marvano (que aqui tanto assina o texto como os desenhos) acompanha-nos numa narrativa centrada nas pistas onde decorrem nestas corridas que eram extremamente populares entre as duas guerras, apesar de ainda longe de formarem um campeonato mundial de Fórmula 1, o que só aconteceria em 1950. Ao mesmo tempo aprofundam-se as caracterizações de personagens, sejam os pilotos reais ou outros ficcionados, bem como os peões ao seu redor, não esquecendo figuras-chave do poder nazi, de Hitler a Goebbels ou Göring, que surgem numa ou outra situação, umas mais factuais, outras nem por isso (como a que tenta encaixar aqui a história da génese do Volkswagen).
A rotina de corridas e resultados – em situações onde não falta uma simpática alusão à herança de Jean Graton nos “vroooam” que sugerem a velocidade dos carros – é entrecruzada não apenas com indicações reais de acontecimentos históricos, como a noite das facas longas ou as olimpíadas de 1936 em Berlim, como com uma história em paralelo que, dado o protagonismo da capital alemã em toda esta narrativa, a aproveita para uma história em paralelo que, cruzando personagens com as que vemos no mundo das corridas, nos lembra cenas de discriminação e perseguição a judeus levadas a cabo pelo regime.
Ao juntar os três volumes de Grand Prix num único com 176 páginas, esta versão “integral” inclui um prefácio de Jacky Ickx e um texto (ilustrado) do próprio Marvano sobre a história das corridas de automóveis, com particular foco na Fórmula 1.
“Grand Prix – L’Integrale”, de Marvano, é um volume de capa dura, com 176 páginas, publicado pela Dauragud.
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