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1986. Um regresso de alma funk com Hitchcock por inspiração

Texto: NUNO GALOPIM

Depois de um ano de pausa do qual resultaram os álbuns dos projetos em pararelo Power Station e Arcadia os Duran Duran reuniam-se para gravar “Notorious” com Nile Rodgers. E entretanto tudo tinha mudado…

O ano de 1985 tinha sido de quase sabática para os Duran Duran. E salvo um segundo single norte-americano extraído do alinhamento de Arena, o ano de novas edições ficou basicamente reduzido ao lançamento de A View to a Kill, a canção-tema para um novo filme da série James Bond, que valeu ao grupo mais um episódio de visibilidade global. Porém, quando o single chegou à rua já o grupo estava dividido em duas fações, cada qual trabalhando projetos em paralelo. John e Andy Taylor, após uma série de ideias de colaborações, fixaram a formação de um projeto para álbum contando com a voz de Robert Palmer e a bateria de Tony Thompson, chamando a estúdio Bernard Edwards (dos Chic) para assumir a produção de um disco onde guitarras mais intensas e angulosas poderiam conviver com um trabalho rítmico que não escondia um gosto por tradições com escola R&B. Chamaram-lhe Power Station e editaram um álbum logo no início do ano. Por outro lado, aprofundando o trabalho de minuciosa cenografia que já havia caracterizado Seven and The Ragged Tiger, Nick Rhodes, Simon Le Bon e Roger Taylor juntavam-se num estúdio de Paris para criar canções sofisticadas e elegantes (que na verdade poderiam ter representado um quarto álbum dos Duran Duran). Com o nome Arcadia, o grupo apresentou o álbum So Red The Rose no final do mesmo ano.

Em 1986 era chegada a hora de reunir. A primeira má notícia veio do baterista Roger Taylor, que anunciou que não tencionava regressar ao trabalho com a banda e se retirava para uma vida mais tranquila. Já o guitarrista Andy Taylor, que entretanto encetara uma carreira a solo de contornos mais hard rock, começou por comparecer em sessões de estúdio, mas após vários desentendimentos e procedimentos legais, acabou por assumir também a partida, tendo contudo deixado uma pequena contribuição para o álbum que entretanto tinham começado a gravar.

Reduzidos à dupla de fundadores (Nick Rhodes – que detém os direitos do nome da banda – e John Taylor) mais o vocalista Simon Le Bon, os Duran Duran avançaram para a conclusão das sessões do novo álbum chamando alguns músicos. Nile Rodgers, que já havia com eles trabalhado na gravação de The Wild Boys, estava desde o início ao leme da produção, definindo desde logo a sua presença um pendor mais funk ao som que começava a nascer. O baterista Steve Ferrone entrou em cena (ficando ali por algum tempo), assim como a estúdio chegava pela primeira vez o ex-Missing Persons Warren Cuccurullo, que acabaria como membro de pleno direito do grupo em 1989 e seria mesmo um dos músicos mais ativos nos Duran Duran até à sua saída após o álbum Pop Trash.

Os ecos das experiências entretanto reveladas via Power Station e Arcadia juntavam entretanto ideias à alma white funk que dominava o disco. Se em canções como Notorious, Skin Trade, So Mislead ou o flirt com domínios latin funk de Meet El Presidente traduzem essa medula que define o som do álbum, já a face mais arty e cenicamente elaborada dos Arcadia se manifesta em canções como Winter Marches On, American Science ou A Matter of Feeling, cabendo à angulosidade para guitarras trazida dos Power Station uma expressão evidente em Hold Me, Vertigo (Do The Demolition) ou parte de Proposition.

O álbum apresentava como título uma das canções que se revelaria um dos mais sólidos êxitos desta nova etapa de vida dos Duran Duran (chegou ao número 2 nos EUA), e que comporta a fase de formação reduzida a três elementos que se materializou neste disco e no sucessor Big Thing, de 1988. O outro single clássico nascido deste alinhamento é Skin Trade, nascida sob um piscar de olho ao modo como Prince cruzava então funk com as linguagens pop. Uma das melhores canções do grupo, evidenciou contudo através de uma performance mais modesta nas tabelas de venda, que o que haviam sido os dias de glória de 81 a 85 eram coisa do passado. A ainda mais discreta vida do terceiro single – Meet El Presidente – acentuou essas mudanças em curso.

O mundo tinha descoberto novos entusiasmos e os Duran Duran eram pela primeira vez confrontados com novas realidades. A resiliência, que os mantém hoje em dia como – juntamente com os U2 e Depeche Mode – raros casos de sobrevivência entre as bandas da sua geração (e note-se que mesmo tendo mudado de formação e retomado mais tarde a “clássica”, na verdade nunca colocaram pela frente um cenário de ponto final), nasce da forma de reagir a este embate. Novos caminhos, novas estratégias e, sobretudo, novos desafios, eram agora o seu horizonte.

Da memória de Notorious vale a pena notar que é um disco profundamente influenciado pelo cinema, sobretudo o de Hitchcock. O tema-título e Vertigo citam concretamente dois filmes seus. E Hold Me chegou a ter The Rope como título de trabalho.

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