15 canções para revisitar 2015
Texto e escolhas: NUNO GALOPIM
Em tempo de fazer contas ao que escutámos ao longo do ano, aqui recordamos 15 canções que vale a pena recordar entre as que contam a história de 2015. A ordenação não é aqui feita por uma ordem de preferência. São 15 canções (sim, para o ano escolheremos 16 para manter a aritmética a fazer rima).
FFS “Johnny Delusional”
De supergrupos está a história cheia de exemplos, mas se na hora de responder à chamada forem os Franz Ferdinand e os Sparks a dizer “presente”, a coisa poderia prometer… E assim foi. FFS, o álbum que criaram em conjunto, mostrou quão fértil pode ser o diálogo quando falta a voz ao monólogo. E conjunto de 12 canções serve um bálsamo aos admiradores de ambas as bandas num alinhamento de canções que cruzam formas e épocas, doseiam personalidades e ideias. O alinhamento abria ao som de Johnny Delusional, canção pop perfeita que reacendeu a luminosidade clássica dos Sparks vintage, tendo sido o perfeito cartão de visita para nos dar a conhecer este encontro.
M.I.A. “Borders”
Uma das mais interessantes autoras do nosso tempo, M.I.A. prepara a edição de um sucessor para o brilhante Matangi, de 2013. Em 2015 surgiram dois singles novos: Swords e Borders. Este último é mais um episódio feliz e marcante numa obra onde não têm faltado momentos como este. A canção mantém os azimutes que Matangi lançou, deixando talvez mais evidente nos cenários uma sugestão de geografia no Médio Oriente. Não é por acaso que o faz, focando a canção e o soberbo vídeo que a acompanha um dos grandes dramas do presente: a crise dos migrantes. Politicamente atenta, a canção marcou uma posição. E foi das que mais souberam traduzir assim num discurso pop a realidade com que os dias de 2015 escreveram alguns dos seus momentos mais dramáticos.
Grimes “Flesh Without Beauty”
Entre uma nova geração de vozes femininas que tomam as electrónicas como ferramenta de trabalho para estruturar de desenhar as suas canções, Grimes (de nome real da canadiana Clare Elise Boucher) confirmou em 2015 as boas expectativas não apenas lançadas em 2012 com o álbum Visions (o seu terceiro) mas também nos singles Go e Entropy que precederam a chegada de Art Angels. Coube então ao muito luminoso Flesh Without Blood ser o (bem escolhido) cartão de visita para o novo disco no qual Grimes confirmou capacidade para continuar a talhar um caminho pessoal no mundo pop digital do nosso tempo. E é entre a enorme variedade de referências (de tempos, geografias e soluções formais) que acaba por encontrar, ao definir uma voz autoral evidente, a chave para ser um caso único. Ah, e o teledisco é fabuloso…
David Fonseca, “Futuro Eu”
Foi já há alguns meses que esta canção entrou em cena como uma surpresa. Não por nela ouvirmos David Fonseca a cantar em português (já o tinha feito por várias vezes, e basta lembrar ou o álbum de estreia dos Silence 4 ou o disco dos Humanos). Mas além de surgir em formato de single (sem ainda revelar que um álbum vinha pelo caminho) e de se fazer apresentar com um teledisco – talvez o melhor da sua obra até aqui – Futuro Eu revelava também caminhos musicais diferentes e desafiantes na música de David Fonseca. E abria apetites a um ano de acontecimentos que soube bem ir acompanhando e que fizeram história (pela música e modelo de trabalho) no panorama pop/rock nacional.
Pop Dell’ Artte “La La La (It’s a Wonderful World)”
Em finais de 2015, com uma data no CCB para assinalar os 30 anos de vida de uma das mais ímpares entre as bandas diferentes nascidas da pop portuguesa dos oitentas (e não só), os Pop Dell’Arte revelaram alguns dos temas que têm estado a compor para um álbum que verá a luz do dia este ano. Entre esses inéditos (que arrancaram valentes aplausos na noite em que foram apresentados no CCB) está este La La La… It’s a Wonderful World que, numa das plataformas de divulgação surge num registo áudio com um “slide” com a frase “Stop Terrorizing”. Aparentemente luminosa a canção é um magnífico retrato dos nossos tempos.
Sufjan Stevens “Should Have Known Better”
Apesar de muitas vezes distante do seu quotidiano, Carrie foi evocada num álbum suave, direto, confessional e por vezes assombrado, através do qual o seu filho enfrentou a perda da mãe. Ele chama-se Sufjan Stevens, é um dos mais inspirados (e inspiradores) entre os músicos da sua geração e, cinco anos após o seu álbum anterior em nome próprio, apresentou no disco que lançou em 2015 uma simples e bela coleção de canções frágeis, de travo folk, sobre a sua mãe e a essa tomada de consciência da noção de perda. Aqui revelou um álbum instrumentalmente simples que é daqueles raros casos em que as palavras encontraram a música certa para criar um ciclo de canções irrepreensível. Podia ter escolhido qualquer um dos temas de um álbum que vale pelo todo.
Animal Collective “FloriDada”
Uma das bandas que mais marcaram o panorama indie na década que abriu o século e que definiu no magnífico Merriweather Post Pavilion (de 2009) a síntese de um processo de busca de uma linguagem muito própria, está em contagem decrescente para a edição de um novo álbum de estúdio (chega às lojas a 19 de fevereiro). Houve contudo já dois momentos em regime de aperitivo. Um deles servido inesperadamente aos que, durante um curto período de tempo, passaram pelo aeroporto de Baltimore (de onde são originários), que teve o disco em passagem em repeat. Mais recentemente, e para todos, um primeiro single surgiu para, em finais de 2016, nos dar (tal como Bowie), uma das boas novas de 2016. E pela amostra estão de volta a terrenos mais pop e luminosos.
Ezra Furman “Restless Year”
Depois de alguns discos promissores, foi com Perpetual Motion People que o norte-americano nos deu em 2015 um álbum que traduziu um oásis de brilhantes canções num tempo de alguma desertificação de ideias em terreno indie. As suas canções aprofundam reflexões sobre identidade, ansiedade e um sentido de desenquadramento perante o mundo ao seu redor que tantas vezes se abate sobre quem não se verga aos ditados normativos. Como Michael Hadreas (ou seja Perfume Genius) aqui encontramos uma voz de referência para os misfits do nosso tempo.
Tame Impala, “’Cause I’m a Man”
E ao terceiro álbum fez-se a diferença. Se nos seus dois primeiros discos os Tame Impala deixavam clara mais uma operação de resgate de ecos e memórias dos dias do rock psicadélico, em Currents juntaram todo um conjunto de elementos que, sem fechar todo esse quadro de referências, as levou antes para um patamar diferente e seu. Na verdade Currents poderia ser um disco a solo de Kevin Parks, que assinou as composições, gravou todos os instrumentos e produziu as sessões das quais nasceu o álbum. ‘Cause I’m a Man foi um dos dois singles a surgir antes do álbum deixando logo o mais evidente trabalho com sintetizadores boas perspetivas sobre o que vinha a caminho. O álbum confirmaria em pleno todas as melhores expectativas.
David Bowie, “Blackstar”
Se em 2013 o regresso se fez em absoluta surpresa e com um álbum que – apesar do sentido de novidade do single que o anunciou – viveu essencialmente de ecos de vivências rock’n’roll mais clássicas encontradas em episódios anteriores da obra de David Bowie, ao anunciar um álbum de estúdio, a editar a 8 de janeiro de 2016, o veterano revelou em Blackstar sinais de um mundo novo. Na verdade há também aqui ecos de trilhos já anteriormente ensaiados, quer no protagonismo jazzy no single Sue (or in a Season of Crime) – que, regravado, surge no álbum – ou em ensaios cénicos experimentados quer em finais dos anos 70, quer em 1.Outside (1995). Mas Blackstar mostra a busca de um novo tipo de canção, longe das formas mais clássicas, experimentando uma teatralidade diferente. E é simplesmente uma das melhores de sempre de Bowie. E atenção que a lista é já extensa.
Duran Duran “Pressure Off”
Antes de mais, e para que não haja equívocos, os Duran Duran nunca estiveram parados nem se separaram. O que aconteceu foi que, depois de uma série de mudanças de formação depois de 1986 reuniram o quinteto “clássico” para gravar um álbum de reencontro em 2004 e, desde 2007, têm vindo a talhar caminhos que lhes estão a dar os seus melhores discos desde os dias de 80. 2015 ouviu-os em Paper Gods, que superou o já de si surpreendente disco de 2010, mas com um valor acrescentado: a contemporaneidade do som. Ou seja, tentando encontrar o que é Duran Duran no presente, sem contudo tropeçar num carnaval de imitações dos novos valores e tendências. Para apresentar o disco chamaram o velho colaborador Nile Rodgers e a voz de Janelle Monáe. E tiveram em Pressure Off o seu melhor single em muitos anos. O estranho foi o silêncio tábua-rasa que a rádio fez a esta canção. Mas isso é outra história.
C Duncan, “Here to There”
Chama-se C Duncan, é escocês, e pelo seu álbum de estreia passam canções que revelam tanto aquela sensação solarenga do fim de tarde quente, como a presença próxima da brisa da maresia, que escutam ecos da folk e de uma alma pastoral mas seguem também os rumos de uma certa dream pop contemporânea, não escondem sonhos de cor e luz (que certamente não haverá em Glasgow) e de uma ordem e arrumação. Nasceram todas elas no quarto do próprio músico, gravadas em etapas, instrumento após instrumento, assegurando o primor de uma discreta mas arrumada produção uma limpidez que faz de Architect (o álbum, que foi nomeado para o Mercury Prize) um ciclo de canções de formas bem nítidas e sedutoras.
Baio “Sister of Pearl”
Um dos elementos dos Vampire Weekend (que este ano estiveram em pousio), Chris Baio apresentou em 2015 um álbum de estreia, significativamente mais vitaminado em boas ideias do que os máxis que antes tinha já revelado. Aqui mostrou um talento pop, sem contudo evitar um relacionamento com as dinâmicas da música de dança. Este tema, contudo, é dos que mais seguem um certo classicismo que Baio tão bem assimila neste disco. A leste dos ditados do hype indie e sem preocupações em seguir os sabores do momento em quaisquer outros domínios, e sem procurar uma caução nos Vampire Weekend, mas mantendo o sentido doce e leve da sua música, Baio faz deste The Names uma bela surpresa. E este foi um dos seus singles.
Ghost Culture “Lucky”
Editado logo em janeiro, e algo ignorado nos 11 meses que se seguiram (apesar de representar mais uma assinatura pela etiqueta Phantasy (de Erol Alkan), o álbum de estreia do projeto Ghost Culture revelou uma das mais interessantes entre as novas propostas de 2015 talhadas com ferramentas eletrónicas. Aqui se revelava mais um caso nascido num quarto, entre a solidão, as ideias e as máquinas, a música evocando frequentemente um saber na relação das electrónicas e dos métodos da dança com a canção como, em finais dos 80 e inícios dos anos 90 encontrámos nos magníficos (e injustamente esquecidos) The Beloved.
Panda Bear “Tropic of Cancer”
O álbum Panda Bear Meets the Grim Reaper foi dos primeiros a conhecer edição em 2015, sendo lançado pela Domino Records logo a 9 de janeiro, o que fez com que talvez escapasse a algumas das memórias retrospetivas apresentadas agora em fim de ano. Do alinhamento do sucessor de Tomboy vale a pena recordar, por exemplo, este Tropic of Cancer, que cruza melancolia com uma luminosidade soalheira e evoca sonoridades pop/rock francesas dos anos 60, pensadas como piscadelas de olho ao que chegava do outro lado do canal da Mancha, como as que então eram tão bem conduzidas por Françoise Hardy.
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