Uma visão pop eletrónica com berço belga
Texto: NUNO GALOPIM
Durante as décadas de 60 e 70 o Festival da Eurovisão acompanhou de perto algumas as revelações que a cultura pop ia levando ao mundo da música. Houve yé yé em meados dos anos 60, discretos laivos de psicadelismo em finais da mesma década, temperos glam em inícios de 70, o disco sound mais adiante… E, em inícios de 80, a pop electrónica. A estreia do género no concurso coube aos Telex, uma banda belga, com carreira desde finais de 70, sob evidente vénia aos “mestres” Kraftwerk.
São um nome talvez hoje esquecido entre o panorama da pop europeia do seu tempo. Os aficionados eurovisivos certamente conhecerão Euro-Vision, a canção que levou, inesperadamente, os sons de uma emergente pop electrónica à Eurovisão em 1980 (os dez pontos dados por Portugal impediram até a canção de ficar em último lugar).
Mas mais significativos do que essa experiência – que sublinha o carácter bem humorado das atitudes do trio belga – os primeiros passos discográficos que os Telex protagonizam ainda em finais dos anos 70 fazem do grupo um dos pioneiros de uma nova forma de entender a canção pop, pelo que o seu álbum de estreia, Looking For St. Tropez, mesmo distante do patamar visionário que então reconhecíamos em álbuns seus contemporâneos lançados por nomes como os Kraftwerk, Yellow Magic Orchestra, D.A.F. ou Suicide, merece morar menos longe do esquecimento a que o tempo entretanto o votou.
Seguindo uma lógica de busca identitária como a qual levara os Kraftwerk a encontrar o seu caminho em inícios dos anos 70, os Telex surgiram em 1978 com vontade de, através de uma ementa instrumental unicamente feita de sintetizadores, procurar um som europeu (por oposição às genéticas da cultura rock, de origem norte-americana). Estreiam-se assim, ainda nesse ano, com uma versão “electrónica” (e talvez sob eventuais tonalidades quase paródicas) de Twist À St. Tropez, um velho êxito dos Les Chats Sauvages (um dos grupos pioneiros do pop/rock francês, em inícios dos anos 60).
Como segundo single apresentaram uma versão, novamente electrónica, de Rock Around The Clock, “clássico” imortalizado na leitura de Bill Halley. Mas quando chegou o seu álbum de estria, e sem abdicar do tom sorridente com que se haviam apresentado nos dois singles que o tinham antecedido, mostaram sinais mais pessoais de abordagem às formas e instrumentos com os quais trabalhavam.
Editado em 1979, Looking For St. Tropez inclui outras versões no alinhamento – uma delas transformando metronomicamente o contemporâneo Ça Planne Pour Moi, de Plastic Bertrand – mas é entre originais como Moskow Diskow ou Pakmoväst que encontramos o melhor da contribuição do grupo para a construção de sinais de mudança que em breve transformariam o panorama da música popular. Recorde-se que estavam ainda por chegar os êxitos maiores dos Human League, Soft Cell, Depeche Mode ou Yazoo que fariam da pop electrónica uma linguagem corrente e muitos eram ainda os espíritos para quem música electrónica não era… música. Pois…
Convenhamos que o álbum de estreia dos Telex, não se pode, de modo algum, comparar aos discos que, pouco depois, nos apresentariam nomes como os já referidos Soft Cell e Depeche Mode, e também Heaven 17, Yello ou New Musik. E o seu percurso posterior é feito de episódios menores (até quando, em 1981, desafiam os Sparks a colaborar na escrita do seu terceiro álbum). Mas a memória pioneira de primeiras ideias de busca de uma identidade pop europeia por via das electrónicas justifica que o seu álbum de estreia não seja peça tão esquecida como o tem sido.
Deixe uma Resposta