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NOS Alive 2016 (dia 2): A queerness dos Years & Years e a teatralidade de Father John Misty

Texto: JOÃO MOÇO

Os Years & Years estrearam-se em Portugal e apresentaram as canções de “Communion”. Houve ainda tempo para a contestação política de Carlão e para a espiritualidade de Father John Misty.

Foto: Arlindo Camacho

Quando no ano passado me propus neste mesmo espaço a escrever sobre Communion, o álbum de estreia dos britânicos Years & Years, citei o crítico Tim Finney, que escreveu sobre esse disco: “The songs carefully map the contours of gay sensuality, filtering lust through a variety of counterparts: not just shame, but vulnerability, self-awareness and annihilating self-abandon”. As canções de Communion centram-se, de facto, em muitas das peculiaridades da vivência queer, com uma perspicácia acutilante. E se por vezes essa vivência ainda se faz sob algum secretismo – basta recordar uma canção como Worship, na qual o vocalista Olly Alxander canta “I’m not gonna tell nobody about you” – foi regenerador ver num festival direcionado para as massas, e no seu maior palco, uma banda como os Years & Years a viverem livremente a sua queerness, tendo em conta o contexto tantas vezes dominado por homens hétero e cisgénero.

Ontem os Years & Years foram a primeira banda a subir ao Palco NOS do NOS Alive, ao final da tarde, e nesta estreia em palcos portugueses comprovaram porque são dos projetos pop mais interessantes do momento. Basta recordar uma canção como Worship, que ontem integrou o alinhamento do concerto, que transpira por todos os poros a referências da gay club pop. No palco, Olly Alexander é o centro das atenções, deixando-se levar pela dança mais hedonista, perdendo-se nesses movimentos e nas suas canções infeciosas, independentemente de ter à frente milhares de pessoas a escrutinar cada momento.

O alinhamento centrou-se, obviamente, nas canções do único álbum que editaram até agora, mas houve oportunidade para ouvir versões de Dark Horses, de Katy Perry, de Hotline Bling, de Drake, juntas como se se tratassem de uma só canção e que, pela máquina synthpop dos Years & Years, ganharam subtilezas que são inexistentes nas suas versões originais. O grupo ainda interpretou um tema inédito, apontado ao funk digital, que mostra que o trio (ontem acompanhado por um baterista e duas vozes femininas no coro) está no bom caminho.

Se os Years & Years não são uma banda política per se, sendo apenas política as suas ações (tal como a de todos os cidadãos), a sua atitude em palco acaba por abrir novas portas para uma crescente liberdade individual.

No entanto, a política fez-se ouvir de forma mais marcadamente contestatária pela voz de Carlão, que atuou ontem no Palco Heineken. Lembrou a sua história de vida, a discriminação racial de que foi alvo, recordando como passou muitos anos a tentar pertencer a grupos até conseguir ser ele mesmo. Recordou o muito recente caso do antigo primeiro-ministro Durão Barroso ter sido nomeado para a presidência não executiva da Goldman Sachs, dedicando-lhe Colarinho Branco. Fez-se acompanhar por amigos, como Moullinex e Sam the Kid, com quem recuperou Pitas Querem Guito, do projeto 5-30, que junta os dois rappers a Fred Pinto Ferreira.

No mesmo palco atuou Father John Misty, que alimentou a devoção dos milhares que ali acorreram para o ver. Existe toda uma teatralidade na sua postura, que faz lembrar um líder espiritual messiânico, teatralidade essa que se impunha com a austera cortina vermelha colocada atrás do músico e da sua banda. A postura messiânica de Father John Misty é compreensivelmente messiânica e a forma como desenvolveu o concerto parece talhada a conquistar os “infiéis” que ainda não foram ao encontro da “palavra”. Ganha pontos quando aposta na sua verve mais country, sentindo-se aí uma verdade identitária que se perde quando se deixa levar por euforias rock’n’roll algo anónimas. Mas no final eram muitos os convertidos e certamente que o músico norte-americano continuará a regressar a palcos portugueses e com o mesmo nível de aclamação.

1 Comment on NOS Alive 2016 (dia 2): A queerness dos Years & Years e a teatralidade de Father John Misty

  1. Father John Misty: religião ou seita?…

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