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Novas assombrações pairam sobre “Twin Peaks”

Texto: NUNO GALOPIM

Em 2015 um museu australiano pediu aos Xiu Xiu que apresentassem a sua visão para a música de “Twin Peaks” numa exposição. Agora o que ali se escutou chegou a um disco.

Do single Do You Know Me Now? (2013) de David Sylvian ao álbum I Dormienti (1999) de Brian Eno, não faltam exemplos de como o espaço dos museus e das galerias de arte são catalisadores para a criação musical, por vezes representando até entidades que as “encomendam” para expor, tal e qual o fazem a artistas plásticos. Neste caso a ideia partiu da Queensland Gallery of Modern Art que, para a exposição David Lynch: Between Two Worlds (2015), encomendou à banda norte-americana Xiu Xiu uma abordagem à música que Angelo Badalamenti tinha composto para a banda sonora da série Twin Peaks. O que era na origem um projeto site specific não ficou todavia fechado entre as salas onde ganhou originalmente forma. E, depois de terem apresentado esta música, ao vivo, durante a exposição, os Xiu Xiu levaram-na para estúdio e gravaram um álbum que começou por surgir como edição especial no Record Store Day e que, agora, está disponível no circuito comercial.

A abordagem é fiel às ideias pelas quais os Xiu Xiu têm definido uma obra ímpar, decididamente pessoal. Ou seja, não há cedências, não há certezas iniciais, tudo é possível… O ponto de partida é a música de Angelo Badalamenti, mantendo-se nítidas (umas vez mais, outras nem por isso) as formas e melodias dos originais. A primeira, e mais evidente, das diferenças nota-se nos cenários, que deixam de ser dominados pelos tons jazzy e de blues assombrados de Badalamenti (que não são contudo apagados) para dar lugar a um quadro mais repleto de acontecimentos que aceitam a presença do ruído, de pequenos elementos electrónicos, de figuras (não menos assombradas) que invadem o espaço e o reclamam como seu.

A abordagem, que conta com a colaboração de Jherek Bischoff, foca mais a construção de uma nova paisagem ambiental – que inevitavelmente exerce um poder de mutação sobre a música – que por vezes desloca as ideias musicais para bem longe dos ambientes cénicos e humanos de América (montanhosa) profunda que a música de Badalamenti nascera para ajudar a ilustrar. Há mesmo ocasiões em que, convenhamos, se perde o norte à coisa e, de Twin Peaks, resta em alguns momentos uma ténue presença que pouco sai do título da faixa, que nos remete para o original.

Xiu Xiu Plays the Music of Twin Peaks é mais interessante como experiência enquadrada num contexto – a exposição, pois é! – do que como um álbum. Um exercício de seleção teria feito nascer aqui um EP de travo gourmet, no qual incluiria Laura Palmer’s Theme, Into The Night, Audrey’s Dance, Dance of The Dream Man e Falling. O álbum, como um todo, junta momentos que resistem menos bem à distância face ao contexto expositivo desta música. Mas tem o mérito de abrir frentes de reflexão sobre uma das mais importantes obras da história da ficção televisiva. Ainda por cima num momento em que estamos em contagem decrescente para o seu regresso aos pequenos ecrãs, em 2017.

Xiu Xiu
“Xiu Xiu Plays the Music of Twin Peaks”
Bella Union / Popstock
★★★

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