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Um visionário do século XX em diálogo com o século XXI

Texto: NUNO GALOPIM

Músico e editor, com carreira há muito definida entre os espaços da música eletrónica, o alemão Marc Romboy juntou-se à Filarmónica de Dortmund para reinventar duas obras do compositor francês Claude Debussy.

Das visões de Bach ou Handel por Wendy Carlos em finais dos anos 60 às abordagens de Herbert a Mahler ou de Ambrose Field a Dufay, muitas obras de referência da música de outras épocas têm vindo a conhecer inúmeras desafiantes abordagens por músicos de várias novas frentes de trabalho nas vanguardas da invenção da música… popular. O contrário tem também acontecido, com Philip Glass a assimilar dois álbuns de Bowie em duas das suas sinfonias ou Steve Reich a reinterpretar recentemente material musical dos Radiohead… Esta é, assim, uma história de diálogos com informação que flui em ambos os sentidos, demonstrando cada vez mais que os muros eventualmente colocados entre a “clássica” e a cultura pop/rock são na verdade construção sobretudo lançada por aquele antigo preconceito de guardião. Na idade da comunicação global, da troca de ideias, da vertigem da descoberta, essa é atitude que cada vez faz menos sentido. E a juntar mais uma nota a esta ideia em construção, eis que chega a disco uma colaboração entre o alemão Marc Romboy e a Orquestra Filarmónica de Dortmund.

O encantamento com o qual Debussy (1862-1918) assinalara a descoberta das potencialidades do gamelão e a música de Java e do Bali na Exposição Universal de 1889 e o modo como depois procurou dar corpo a essas possibilidades na sua própria música é uma memória que Romboy cita quando lhe pedem que explique esta ligação com o compositor francês. Na verdade Romboy não é de todo o primeiro músico do nosso tempo a fazê-lo, o que mostra como o autor de uma das obras que mais abriram horizontes para a chegada das músicas do século XX é ainda hoje importante fonte de inspiração. Isao Tomita assinalou em 1974, em Snowflakes Are Dancing, uma importante visão eletrónica sobre memórias de Debussy. Marc Almond abordara, depois, no álbum The Tennement Symphony (1991) as Trois Chansons de Bilitis. Em 1999 os The Art Of Noise juntaram-se (numa nova formação) para gravar The Seduction of Claude Debussy, um álbum de diálogos com a sua música e legado.

Agora é a vez de Marc Romboy, num álbum gravado ao vivo que junta La Mer e Prélude à l’après-midi d’un faune numa abordagem para eletrónicas na qual conta com as colaborações do programador de som Ali Khalaj e da Filarmónica de Dortmund, dirigida por Ingo-Martin Stadtmüller. O registo é algo semelhante ao que foi sugerido por algumas das abordagens da série Re-Composed, juntando num palco comum a orquestra e as ferramentas eletrónicas num processo que é por vezes mais de diálogo do que de assimilação, valorizando assim as presenças de ambas as realidades, épocas e fontes instrumentais. Face a outras “re-composições” (como as de Vivaldi por Max Richter, as de Ravel e Mussorgsky por Moritz Von Oswald), esta “reconstrução” de obras de Debussy podia ser mais imaginativa… Mas não deixa de representar um ponto de vista interessante sobre um legado que lança sobre nós inúmeras possibilidades.

“Reconstructing Debussy”, de Marc Romboy, está disponível em 2LP, CD e nas plataformas digitais, num lançamento da Hyperharmonic.

Podem ver aqui um vídeo com um excerto desta gravação:

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