Os Blancmange em dez canções
Seleção e textos: NUNO GALOPIM
Os Blancmange foram uma importante força da geração pop electrónica que fez escola no Reino Unido na primeira metade dos oitentas, são muitas vezes secundarizados ou mesmo esquecidos e, quando recordados, tantas vezes reduzidos à memória de canções como Don’t Tell Me ou Living on The Ceiling, os dois singles de maior sucesso da sua discografia.
A verdade é que este duo britânico – e sobretudo os seus dois primeiros álbuns, Happy Families (1982) e Mange Tout (1984) – não estão aquém do que por essa altura assinavam nomes hoje mais vezes recordados como os OMD, Human League, Soft Cell, Yazoo, Heaven 17 ou Depeche Mode, todos eles com créditos reconhecidos no mesmo comprimento de onda. À prática de uma pop luminosa feita com electrónicas os Blancmange juntavam uma postura vocal mais angulosa (de evidente herança pós-punk) e um gosto pelo exotismo nos temperos (que ganharia maior visibilidade ainda no projeto West India Company que Stephen Luscombe, um dos elementos do duo, editaria depois da primeira separação, na segunda metade dos oitentas).
Após um longo hiato, os Blancmange reuniram-se e voltaram aos discos com Blanc Burn em 2011. O regresso à atividade levou-os à estrada. E seguiram-se mais discos, mantendo-se a dupla ainda em atividade. No momento em que é lançada uma caixa antológica com a sua obra gravada nos oitentas vamos aqui recordar essa etapa num conjunto de dez canções.
“Waves” (1983)
Extraído do álbum de estreia Happy Families (de 1982) mas editado no formato de single já em 1983 o tema Waves representou o encerramento da etapa inicial da discografia dos Blancmange com uma canção que conciliava eletrónicas, coros e um arranjo de cordas que abria caminho a uma maior copmplexidade nos jogos de timbres que ganharia forma no segundo álbum, que seria editado só em 1984. O single representou a segunda presença dos Blancmange no Top 20 britânico, alcançando o número 19.
“I’ve Seen The World” (1982)
Depois de Living on The Ceiling o segundo single a dar vida, a 45 rotações, às canções do álbum de estreia dos Blancmange, Happy Families, sublinhou uma faceta melodista de um cuidado labor na utilização de várias camadas de registos eletrónicos. Ficou longe de ser um êxito, mas é dos temas mais cativantes desta etapa da vida do grupo.
“Feel Me” (1982)
Um dos melhores momentos do álbum de estreia dos Blancmange corresponde a um episódio de anguloso entendimento entre a exposição de uma pop eletrónica intensa (e pouco polida) e a presença de uma dinâmica rítmica mais próxima das heranças do funk. Longe de ser um dos temas mais acessíveis do álbum, Feel Me representa um dos momentos de mais clara expressão de uma identidade que, mesmo usando as ferramentas do seu tempo, procurava caminhos que não eram de todos os que tomavam aqueles que então procuravam uma mais certeira consagração mainstream.
“Living on The Celing” (1982)
Editado em 1982 Living On The Ceiling foi o terceiro single do duo e o primeiro a dar-lhes grande visibilidade internacional, através de uma canção que acrescenta temperos colhidos na música do mundo árabe a uma ementa essencialmente pop definindo um modo de cruzar geografias e linguagens musicais que surgiria em outras ocasiões na sua obra. O próprio teledisco procurava já estabelecer estas relações.
“Blind Vision” (1983)
Editado em 1983 este foi o single que apresentou uma primeira ideia daquilo que poderia vir a ser o segundo álbum dos Blancmange, que chegaria às lojas de discos apenas em 1984. Blind Vision revelava um trabalho mais elaborado na construção dos arranjos e um detalhe maior na definição dos sons através do trabalho de produção. Mesmo sem repetir o impacte de Living On The Ceiling deu-lhes um segundo Top 10 no Reino Unido.
“That’s Love That It Is” (1983)
Integrando uma estrutura rítmica que piscava, discretamente, o olho ao emergente hi-nrg, os Blancmange tiveram em That’s Love That It Is o segundo single de Mange Tout, o seu segundo álbum de estúdio. Não repetiu o sucesso dos três singles anteriores mas representa hoje um claro exemplo da identidade sonora complexa e aberta a explorações em vários sentidos que os arranjos das canções desta dupla então procuravam.
“Don’t Tell Me” (1984)
Mange Tout sucedeu, em 1984, à estreia de Happy Families. Sem procurar novos destinos, o álbum aprofunda a exploração de uma pop electrónica com gosto pelo trabalho de arranjos e, ocasionalmente, revelando o interesse pela procura de temperos noutras latitudes. Don’t Tell Me, o terceiro single extraído do álbum foi então aquele que mais impacte teve então no panorama pop europeu.
“The Day Before You Came” (1984)
Eram ainda relativamente recentes as notícias da interrupção (até hoje sem fim) da carreira dos Abba quando, no alinhamento do segundo álbum dos Blancmange, surgiu uma versão de um dos seus últimos singles. The Day Before You Came, surge pelos Blancmange com uma leitura com discreto tempero invulgar, no qual encontramos o som de tablas e outros sabores indianos. Foi extraído como single.
“What’s Your Problem” (1985)
Para o terceiro álbum, editado quase um ano e meio após Mange Tout os Blancmange optaram por um caminho pop menos focado na presença de elementos de outras geografias culturais. Os sintetizadores mantiveram-se na linha da frente da criação sonora, embora a seu lado a paleta instrumental tenha aceite aqui a presença de outras ideias mais próximas do cânone pop ocidental. Para apresentar as canções de Believe You Me escolheram como single de apresentação o tema What’s Your Problem que acabaria por se traduzir no último “êxito” de Top 40 na discografia da dupla.
“Paddington” (2015)
Reunidos em 2011, os Blancmange assinalaram o seu regresso aos discos com Blanc Burn, álbum que editaram nesse ano. A saúde de Stephen Luscombe não lhe permitiu continuar a trabalhar, optando então Neil Arthur por manter a banda ativa, contando com a ajuda de músicos de estúdio. Em 2015 este Paddington foi o cartão de apresentação de Semi Detached, o primeiro álbum desta nova etapa de vida dos Blancmange. A canção recuperava de forma evidente algumas linhas clássicas da identidade da banda.
Republicou isto em O LADO ESCURO DA LUA.
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