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OMD: “O ‘Electricity’ tem uma sensibilidade ‘punk’. Era o nosso equivalente a tocar três acordes numa guitarra”

Texto: NUNO GALOPIM

A poucos dias da atuação dos OMD na Aula Magna, em Lisboa, Paul Humphreys fala à Máquina de Escrever sobre o presente e o passado de uma banda que este ano vai celebrar os seus 40 anos de atividade.

Banda com história marcante no panorama da pop eletrónica, os Orchestral Maouevers in the Dark (aos quais toda a gente chama OMD) regressam a Portugal esta semana, com um concerto marcado para dia 16 na Aula Magna, em Lisboa. Paul Humphreys, um dos dois fundadores do grupo, falou à Máquina de Escrever sobre o momento que vivem e recordou algumas memórias que passam por discos históricos como Architecture & Morality (1981) ou Dazzle Ships (1983) e lembra como ficou indignado quando Tony Wilson (da mítica Factory Records) lhe disse que a música eletrónica que faziam há 40 anos era o futuro da música pop.

Em 2018 haverá (em breve) notícias de edições especiais que assinalarão a passagem dos 40 anos sobre o início da atividade dos OMD. Para já podemos começar por vê-los ao vivo… Já agora vale a pena lembrar que, em 2017, editaram The Punishment of Luxury, que é um dos seus melhores álbuns…

Mas escutemos as palavras de Paul Humphreys…

Os OMD passaram por várias etapas. E na verdade o Paul esteve ausente numa delas, durante a década de 90…
Eu não saí porque queria que os OMD acabassem. Saí porque estava exausto nos OMD. E naquela altura estávamos cansados e sem dinheiro porque o contrato que tínhamos era mesmo mau… Na verdade só começámos a ganhar dinheiro depois de parar os OMD… Que ironia! Também não estava feliz com os discos que estávamos a fazer, e senti que tinha de parar… Mas os OMD eram uma marca. E tanto o management como a editora queriam que a banda continuasse, e o Andy disse então que o faria. E eu deixei que assim fosse…

Pelo que foi apenas ele quem manteve os OMD nos anos 90… Houve uns OMD dos 80s e uns OMD dos 90s…
Nos anos 80 víamos a música eletrónica como sendo uma coisa do futuro. Era assim que eu e o Andy pensávamos que ia ser. Achávamos que se ia destronar o rock’n’roll e que a música eletrónica era ser o que as pessoas iriam escutar. Mas depois não foi bem assim… Nos anos 90 houve o brit pop, o grunge… E de repente o futuro era a música dos anos 60 e 70. E parecia não haver lugar para a música eletrónica. Senti que isso ia acontecer nos anos 90. E o Andy sentiu na pele que assim foi. E depois até ele deixou de fazer música, depois de Universal (1996). Mas depois na viragem do milénio entrámos numa era pós-moderna em que a música eletrónica voltou a ser cool. Na verdade as coisas deixaram de ser lineares na relação das músicas com as modas. Deixou de ser importante o género musical com que as pessoas poderiam lidar quando se chegou aos anos 2000. Era mais uma questão de ser bom ou não, mais do que ser deste género ou aquele, se está ou não na moda.

E foi aí que fez sentido o regresso?
Os OMD poderiam existir novamente neste contexto. Apercebi-me disso e resolvemos organizar uns concertos e pôr uns bilhetes à venda. Tinham passado dez anos e não imaginávamos se ainda haveria interesse pelo que fazíamos. Mas a verdade é que houve. E tanto houve que, entretanto, fizemos já três álbuns.

Quando regressaram, e ainda antes de terem novas canções, focaram sobretudo os vossos concertos de regresso em torno dos álbuns Architecture & Morality (1981) e Dazzle Ships (1983). Porquê estes discos entre outros mais da vossa discografia?
Creio foram os nossos melhores momentos. E foi nisso que nos quisemos então focar. Esses discos são muito diferentes entre si, mas são musicalmente os maiores sucessos da nossa obra. Não comercialmente, porque o Dazzle Ships foi um desastre nas vendas. O Architecture & Morality foi o nosso disco mais completo. E também o que comercialmente resultou da melhor forma. O Dazzle Ships foi uma tentativa de explorar as vanguardas do que era possível com a tecnologia de então. E foi como saltar de um abismo…

Mesmo não tendo repetido o sucesso comercial de Architecture & Morality, Dazzle Ships conquistou entretanto o seu lugar na história da pop eletrónica…
Creio que sim. Com o tempo ganhou reconhecimento. Mas na altura pareceu uma coisa estranha para muitos… Parecia que os OMD queriam desfazer-se de grande parte do seu público, pensaram alguns que olhavam para o disco como sendo esquisito e experimental. A verdade é que as bandas que entretanto passaram a apontar os OMD como uma referência citam sempre o Dazzle Ships como sendo o disco de que mais gostam.

Era um disco que definia um tema e explorava-o, um pouco como acontecia então com os discos dos Kraftwerk…
Eu e o Andy não éramos aquilo que poderíamos ver como músicos políticos, mas tínhamos uma consciência política do que se passava ao nosso redor. E procurámos como podíamos refletir sobre aquilo em que pensávamos na nossa música. Vivia-se então um tempo de guerra fria. E quisemos explorar isso. Nunca gostámos daqueles clichés do rock’n’roll quando se fala do conteúdo das letras. E os Kraftwert tinham-nos mostrado que se podiam fazer canções sobre o que se entendesse… Então resolvemos trazer estes assuntos para a nossa música sem contudo parecer que estávamos a pregar a quem nos ouvisse.


Depois de tocarem ao vivo, sobretudo levando aos alinhamentos essas memórias desses dois discos, quando encararam a possibilidade de, em vez de recordar, criar algo novo?
Foi um pouco assustador. Já tínhamos começado a tocar regularmente e, entretanto, os anos começaram a passar… Eu e o Andy um dia olhámos um para o outro e dissemos a nós mesmos: é agora! Tínhamos estado a viver das nossas glórias de outros tempos e corríamos o risco de nos tornarmos de uma banda de tributo a nós mesmos. Teríamos algo mais a dizer?… Não podíamos continuar a tocar sem ter nada de novo para dizer… O que é que poderíamos para dizer de novo usando a voz dos OMD? Resolvemos então ir para estúdio sem dizer nada a ninguém. Começámos a escrever… E aconteceu. History Of Modern pode não ser um álbum maior… Mas é o que é. E é um disco bom! Mas com esse disco percebemos que ainda tínhamos algo a dizer usando a voz dos OMD. E decidimos então usar esse disco para pôr o motor novamente a trabalhar. Porque precisava de óleo… Há muito que não fazíamos canções e era preciso pôr a máquina novamente a funcionar. Trouxemos ideias que já tínhamos e que não haviam sido usadas… Quando chegámos ao English Electric, em ???, aí já tínhamos encontrado um caminho e conseguimos reencontrar as nossas próprias raízes. E tudo isso sem receio de ser experimental ou de tentar coisas novas…

Com o mais recente The Punishment Of Luxury já não há sinais de um motor a aquecer… Já corre muito bem novamente…
Tocar o Dazzle Ships ao vivo foi importante para que aqui se chegasse. Houve um concerto no Royal Albert Hall em que tocámos o Architecture & Morality, o Dazzle Ships e os lados B daquela altura. E tivemos de preparar essas canções… Estavamos a trabalhar no Punishment of Luxury ao mesmo tempo… E apercebemo-nos quão incrivelmente simples eram as canções daqueles dois álbuns. E isso fez-nos reencontrar o modo como costumávamos trabalhar, pelo que decidimos aplicar tudo isso ao novo disco. Ao desconstruir e reconstruir as canções do nosso passado reaprendemos velhas lições. E passámos o tempo a dizer: menos é mais… menos é mais… Com a tecnologia atual pode fazer-se tanto mais, pode ir-se mais longe. Mas ter mais não é necessariamente bom… Lançamos muitas ideias nas canções, mas depois apagámos muitas delas.

Como é que, sem perder a voz dos OMD, se foram adaptando às novas ferramentas e tecnologias que foram surgindo nestes 40 anos?…
Creio que o que aprendemos ao longo deste anos todos é que temos uma assinatura nossa. Eu tenho uma certa maneira de criar melodias que, independentemente dos sons, soam a OMD… E o Andy tem também um modo de escrever e de cantar… Juntos definimos essa assinatura… E seja qual for a direção que tomemos, essa assinatura acabará sempre por emergir. Mesmo que usemos novas tecnologias essa identidade dos OMD acabará sempre por emergir.

Já passaram 40 anos desde que começaram a tocar juntos… 40 anos era algo que em tempos só associávamos a bandas como uns Rolling Stones…
Acho que a indústria da música tornou-se menos focada nas idades. Quando começámos os Rollong Stones já tinham uns anos de vida… E quando eles chegaram aos 40 anos de carreira ficámos todos espantados por estarem ainda juntos e a trabalhar. Para um Paul e o Andy teenagers, dizerem-lhes que íamos estar a fazer música 40 anos depois faria com que eles pedissem que lhes dessem um tiro! Parecia impossível… Mas se o Paul e o Andy teenagers ouvissem este Punishment Of Luxury que surgiu 40 anos depois teriam ficado espantados: ainda o conseguem fazer!


Nesses dias os teenagers Andy e Paul certamente soavam bem diferentes das demais bandas que iam surgindo na Liverpool de finais dos anos 70…
Não nos integrávamos, de facto. Eramos diferentes. Havia grandes bandas a emergir em Liverpool por esses dias. Havia os Echo & The Bunnymen, os Teardrop Explodes, os Frankie Goes To Hollywood, os Dead or Alive… Mas nenhuma das bandas era particularmente focada nas eletrónicas naqueles dias. Eram mais bandas de rock… Na verdade tentámos editar por uma editora local e não se mostraram interessados. E acabámos numa editora de Manchester…

Não foi estranho? Uma banda de Liverpool numa editora de Manchester?
Um pouco… Mas aconteceu porque a nossa primeira atuação, em setembro de 1978, foi numa primeira parte para os Joy Division, no Eric’s, em Liverpool. Ia ser apenas uma experiência para um concerto… Mas a malta que tinha vindo de Manchester disse que tinham lá um clube e perguntaram se não queríamos lá ir tocar… Conhecemos o Tony Wilson, que nos disse que ia criar uma editora… Ele disse-nos que o que estávamos a fazer era o futuro da música pop… Ao que respondemos: nada disso! Isto é experimental!

A verdade é que até aí a música eletrónica estava mais ligada às vanguardas…
De facto… Mas o Tony insistiu que éramos o futuro da pop… E nós ficámos indignados! Como é possível? Isto é a nossa arte! (risos) Mas ele tinha razão… Estávamos a usar eletrónicas. E o som era diferente e invulgar… Mas se olharmos para trás hoje notamos que estavam ali boas melodias. Melodias pop.

Qual foi o primeiro disco dos OMD que vos pareceu indicar que tinham achado a vossa voz? Foi logo com Electricity, em 1979?
Creio que sim. Tínhamos encontrado a nossa música alternativa já antes do punk ter acontecido. Gostámos do punk, que se note… E o Electricity tem uma sensibilidade punk. Era muito básico e não exigia grandes competências instrumentais para ser tocada. Até porque as não tínhamos. Era o nosso equivalente a tocar três acordes numa guitarra. Mas depois resolvemos aprofundar mais ainda a nossa relação com as eletrónicas. E no nosso primeiro álbum temos canções que refletem a vontade de olhar para o futuro e tentar imaginar o caminho para lá chegar.


Um processo que não vos fez voltar as coisas ao passado e até ao rock… Tiveram uma versão de Waiting For The Man no lado B de Messages!
Sim, é verdade. O que se passava era que ouvíamos poucos artistas. Ouvíamos os Kraftwerk, os La Dusseldorf, os Velvet Underground e David Bowie. Embora não sejam óbvias as marcas de Bowie, éramos grandes admiradores dele. Alguma da sua sensibilidade pop cativou a nossa atenção. Ele fazia grandes canções.

O que podemos esperar de um concerto dos OMD em 2018?
Esta é uma pequena digressão na qual só eu e o Andy estamos a tocar. São vamos levar a nossa banda completa para a estrada nestes concertos. Vamos brevemente ter uma grande digressão na América com a banda mais completa. Mas é bom poder despir as coisas e ter por vezes uns concertos mais electro… Por isso marcámos esta pequena tour electro. São apenas algumas datas, estas que estamos a fazer em dueto.

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