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Canções pop para uma pequena era negra

Texto: NUNO GALOPIM

Motivados pelo momento político que o seu país está a atravessar, os norte-americanos MGMT apresentam no quarto álbum, ao qual chamam “Little Dark Age”, o verdadeiro sucessor de “Oracular Spectacular” e “Congratulations”, acentuando mais do que nunca um gosto pela canção pop.

Apesar do berço vivido em nicho indie nova-iorquino, os MGMT conheceram um momento de sucesso alargado quando singles como Time to Pretend e Kids chamaram atenções para o álbum de estreia Oracular Spectacular bem acima daquilo que muitos antes poderiam esperar. O estatuto então conquistado levantou fasquias de espectativa que não perturbaram, contudo, o rumo criativo de uma banda que apontou o segundo álbum, Congratulations, a uma exploração das suas ideias e não a uma eventual resposta de continuidade a quem esperava mais do mesmo… Se no departamento da “popularidade” mainstream a coisa recuou, artisticamente o grupo juntou com esse segundo disco um novo episódio tão sólido quanto o primeiro, vincando mais ainda expressões de encantamento por heranças do psicadelismo dos sessentas, não perdendo marcas de uma certa sensibilidade indie muito ao jeito do que ia ganhando forma na passagem da primeira para a segunda década deste século. É verdade que pareceram algo desnorteados e sem rumo bem definido quando, em 2013, editaram (quase sem que se notasse) um terceiro álbum ao qual chamaram apenas MGMT… Pareciam então ser mais um daqueles casos notáveis fadados a esmorecer gradualmente como tantos outros que a história da cultura pop/rock já antes conheceu. Mas eis senão quando, chegados a 2018, nos apresentam um álbum no qual parecem encontrar o passo em frente que Oracular Spectacular e Congratulations pediram e que MGMT não concretizara.

Com o título Little Dark Age o quarto álbum dos MGMT é como aqueles cozinhados cheios de bons ingredientes e temperos e nos quais sentimos todos os sabores. Estão aqui as marcas das heranças clássicas do psicadelismo dos sessentas que tão bem o grupo acolhera já nos seus dois primeiros álbuns, assim como são bem visíveis as presenças de cores e timbres variados que assentam bem nos padrões do gosto pela fuga às normas da saison, que caracterizam um dos valores mais apelativos da cultura indie (sem bem que também aí há ciclos de modas e tendências, é verdade). De novo, e sugerindo uma atitude com afinidade com o que assistimos nuns Tame Impala na passagem do segundo para o terceiro álbum, há aqui uma valorização mais evidente da presença da forma da canção pop. Pop que não procura seguir os caminhos mais em voga no presente, mas antes a assimilação de ecos de outros estímulos (muitas vezes captados nos oitentas), criando diálogos de sons e sabores que, na verdade, mais do que a surpresa da absoluta novidade, abrem claras ligações a espaços já visitados pelas canções dos MGMT nos momentos mais luminosos dos seus dois primeiros álbuns. E aqui nascem verdadeiras pérolas indie pop como One Thing Left To Try, Me and Michael ou tema que dá título ao disco. Não se perdendo, como escutamos por exemplo em Days That Got Away, o sentido mais exploratório que a música dos MGMT sempre gostou de vestir.

Little Dark Age é um disco politicamente desencadeado pela vitória de Trump nas presidenciais de 2016 e, por isso, reflete sinais dos tempos que correm. O contexto serviu assim de estímulo a uma resposta que nasceu da (re)ativação do viço de uma banda que, afinal, parece longe de ter esgotado as ideias. A constatação de adversidades no mundo ao nosso redor faz destas coisas… E ainda bem.

“Little Dark Age”, dos MGMT, está disponível em LP, CD e nas plataformas digitais numa edição da Columbia/Sony Music ★★★★


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