Música para combater as sombras
Texto: NUNO GALOPIM
Não serei de todo o primeiro a dizê-lo… Mas, perante o novo disco de David Byrne as primeiras palavras que penso para o descrever é que… é um disco de David Byrne. E na verdade há nesta descrição todo um programa que envolver uma grande amplitude de timbres instrumentais, uma construção musical amiga do desafio de cruzar tradições e modernidades, palavras bem escolhidas, colaboradores criativos e uma voz única… E quase que podíamos ficar por aqui, correndo, todavia, estas frases, o risco de se poderem aplicar a qualquer outro dos seus discos. E American Utopia tem, como qualquer dos seus álbuns, características que juntam depois elementos distintivos a esta paleta gourmet de variáveis.
Em primeiro lugar disco é parte de um projeto multimédia maior (sob o título Reasons To Be Cheerful) que visa comunicar valores e vibrações positivas num tempo em que sobras nos atormentam. E Byrne não esconde que, pelos EUA, são particularmente densas… Pelas canções de American Utopia passam ecos dessas constatações, assim como reflexões na forma de pequenas ficções. Mas, como sempre nos discos de David Byrne, é na construção musical que residem os melhores sabores.
E aí, as marcas de identidade autoral – que estabelecem naturais afinidades entre as novas canções e memórias de discos anteriores – aceitam aqui a convivência com outras vivências e contágios. E muitas das novidades partem das colaborações em jogo, que vão de Brian Eno (que coassina grande parte dos temas e produção) a Daniel Lopatin (que sublinha, juntamente com Eno, tonalidades eletrónicas) ou Sampha… Desses jogos nascem canções com sabor a familiar e novidade ao mesmo tempo. Mas que não deixam nunca dúvida sobre de quem se fala… E, depois de um trio de discos criados em colaboração – um com Brian Eno, um com Norman Cook e outro ainda com St. Vincent – eis que encontramos finalmente o sucessor de Grown Backwards… Passaram 14 anos. Mas o episódio é de segura continuidade.
“American Utopia”, de David Byrne, está disponível em LP, CD e nas plataformas digitais, numa edição da Nonesuch. ★★★★
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