No café dos desejos
Texto: JOSÉ RAPOSO
Os filmes de Paolo Genovese assentam frequentemente em premissas que colocam os seus personagens numa espécie de encontro forçado – um “confronto” que, dito de uma forma muito generalizada, procura fazer algum sentido não só da relação que estabelecemos com os outros, mas também da identidade de cada um.
Ambientado num imaginário propício a situações com algum humor, um dos seus traços mais acentuados passa por colocar a noção de família, e tudo aquilo que aí possa ainda existir de nuclear para a sociedade e para o indivíduo, no centro das suas preocupações narrativas. Foi assim em obras como Una Famiglia Perfetta, uma comédia na qual um homem abastado festejava o Natal com uma família que afinal não tinha nada de genuíno, onde os “familiares” eram contratados para representar o papel que lhes era atribuído; e em Amigos Amigos, Telemóveis à Parte, uma história centrada num jantar entre amigos com uma regra muito particular: os conteúdos das mensagens privadas e chamadas recebidas durante a refeição têm que ser revelados e partilhados entre todos. The Place distancia-se, em certa medida, deste universo de “laços afetivos”, mas mantém a mesma lógica formulaica – trata-se, enfim, de uma adaptação de uma série televisiva que não traz nada de assinalável para o campo do cinema.
Em todo o caso, uma das formas de olhar para este The Place será pensar no café onde decorre a ação do filme enquanto “fábrica de histórias”, todas com o mesmo ponto comum – os desejos dos personagens e a forma de os alcançar. A narrativa, essa, é esboçada com algum esquematismo: um homem envolto num certo mistério encontra-se todos os dias na mesma mesa do café de sempre (o The Place que dá o título ao filme), onde se dedica a “atender” pessoas que o consultam para pedir desejos. A sua figura é um misto de “psicólogo” e uma espécie de “bruxo charlatão”, e para cada desejo que se compromete a realizar há um “preço” a pagar. É uma premissa que pode servir de pretexto para pensar a relação entre os anseios e a personalidade de cada um, e a diversidade dos pedidos que ali são rogados diariamente acaba por dizer alguma coisa sobre aquilo que, coletivamente, se entende por felicidade. Do mais altruísta ao mais imediato, há um pouco de tudo: um mecânico anseia por uma aventura sexual com uma modelo de calendário; uma senhora pretende ver o seu marido livre de uma doença mortal; uma freira deseja voltar a sentir a presença de Deus após ter perdido a “fé”, e assim sucessivamente.
Numa história em que a ligação entre os personagens se vai revelando aos poucos, um dos aspectos mais relevantes do filme passa pela forma como traz para primeiro plano, com alguma economia de meios, um conjunto de narrativas de maior ou menor interesse – há, por assim dizer, muitas histórias dentro deste The Place, ainda que a visão de conjunto não seja beneficiada pelo cruzamento narrativo, de resto previsível e muito pouco inventivo.
Não só a premissa é particularmente tépida como a sua concretização no plano cinematográfico é francamente desinspirada. Construído em torno dos diálogos à volta dos desejos de cada um, e das peripécias em que têm que se envolver para que a sua vontade lhes seja concedida, o filme acaba por sofrer pela monotonia resultante da ação decorrer no mesmo espaço, o interior do café. Não há nada de imaginativo nos recorrentes campo-contracampo com que Genovese faz avançar o enredo, e a impressão com que se fica é a de estarmos perante um universo estético absolutamente limitado, no limiar da pobreza.
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