E desta vez a “força” não andou muito por ali…
Texto: NUNO GALOPIM
Mais dia, menos dia, mais filme, menos filme, haveria de chegar o momento em que a noção de franchise se tornasse demasiado evidente no universo Star Wars. A compra da Lucasfilm pela Disney e o programa de reativação da saga no grande ecrã lançaram uma agenda intensa com um caderno de encargos a cumprir. Convenhamos que a J.J. Abrams coube, em O Despertar da Força, o cumprimento do desafio de devolver Star Wars à essência da memória do que fora a trilogia original (afastando-se substancialmente das experiências à la videojogo da segunda trilogia). E com Ryan Jonhson, no mais recente Os Últimos Jedi, a saga somou novas pistas e possibilidades, revelando o filme uma saborosa proposta de novas possibilidades a explorar no futuro… Compreende-se, por isso, a expectativa com que se aguarda, em 2019, o desfecho desta terceira trilogia… Mas pelo caminho, e nos anos pares, eis que surgiu uma nova frente de trabalho. Os filmes avulso. Anthology films, como lhes resolveram chamar. Filmes que se enquadram na cronologia e mitologias do universo Star Wars, mas que exploram narrativas que podem transcender os rumos da saga central. Na verdade, Rogue One (2016) optou por contar o que poderia ser um prólogo do filme Star Wars original, de 1977. E fê-lo brilhantemente, conquistando inclusivamente um merecido lugar entre os melhores momentos da história desta saga… Han Solo – Uma História de Star Wars, é o segundo destes capítulos intercalares… Mas mesmo exibindo a competência de uma veterana equipa de realização e argumento, não deixa de ser o filme que mais parece querer colocar a todo o custo na história e nas imagens uma série de elementos que nos permitam ter a certeza de que, sim, estamos em solo Star Wars… Na verdade Solo mais parece um western espacial, com nomes e lugares do universo criado por George Lucas… E em poucas vezes essas ligações são sólidas. É um mau filme? Não diria mau… É um razoável e competente filme de ação com vitaminas sci-fi… Mas de Star Wars pouco tem além da constante necessidade de estabelecer laços com personagens e mitologias da saga. De resto, e se a bilheteira estiver de feição, não me admiro de houver sequela. Um Han Solo 2… Mesmo sendo este jovem Han Solo uma versão com carisma de dieta quando comparado com a figura brilhantemente criada em tempos por Harrisson Ford.
A primeira pedra no sapato de Han Solo é mesmo o ator Alden Ehrenreich. Que parece tão ser Han Solo quanto o par Valerian e Laureline de Luc Besson era face às figuras da banda desenhada. Este Han Solo é um “pin up” do nosso tempo e não soube dotar a sua personagem das características de sarcasmo e classe do Han Solo de que temos memória de outros filmes. Salva o elenco um credível bandido cata-vento (porque vai para onde a segurança lhe sopre) interpretado por Woody Harrelson, um Lando Calrissian com charme de costureiro de design da moda e o L3, um robot que, contra a memória dos até aqui vistos em domínio Star Wars, é um ativista pelos direitos dos droids (com desejos de revolução e tudo). Melhor do que o novo Han Solo está, o seu companheiro Chewbacca (que completa com Lando Calrissian o trio de personagens centrais já conhecidas, sendo de notar que em papéis menores há outros mais reencontros, um deles difícil de justificar, mas aí está uma das razões que sugerem a eventual sequela).
Se os episódios VII e VIII foram alvo de críticas de Disneyficação – o que era evidente sobretudo nas figuras do robot BB8 ou dos passarinhos de grandes olhos do planeta distante ao qual foi parar Luke Skywalker – este Han Solo, na verdade, parece muito mais ser um filme pensado com a necessidade de usar uma lista de ingredientes. O ar de gigante bicho da seda da cacique local Lady Proxima ou o tom à la Mad Max de uma trupe de piratas que assombra o grupo ao qual o jovem Solo procuram juntar novos elementos (sem grande sucesso, diga-se) a um quadro de obrigações de inserção do filme na mitologia Star Wars. Não será spoiler para ninguém imaginar que alguns dos “feitos” do passado de Han Solo aqui se materializam… E para bom entendedor a pista deve bastar…
Se excluirmos a falta de carisma à la Han Solo do novo Han Solo e se soubermos conviver bem com as citações de ligação à mitologia Star Wars – sem contudo ser tão explícita como em Rogue One a presença do Império e omitida de todo a “força” e os jedi – o filme de Ron Howard (que refez e acabou o que a dupla Phil Lord e Christopher Miller começara) mostra que há possibilidades de exploração deste universo mais longe das geografias e do epicentro da trama da saga central. Passado no submundo de bandidos, contrabandistas e do crime organizado, meio western meio filme de gangsters, sem que falte até um assalto a um comboio, Han Solo só é Star Wars por uns fios atados à pressão. Falar na Kessel Run, ver o primeiro encontro de Solo com Chewbacca, descobrir até mesmo as raízes do seu nome, são episódios pontuais que nos ligam a Star Wars. Mas só o nome da personagem central (tal como Lando e Chewbacca) e o Millenium Falcon nos garantem que, no resto dos momentos, ainda estamos neste universo… Han Solo peca sobretudo por querer fazer uma história de Han Solo sem explorar devidamente as características da personagem e por nos querer lembrar a todo o momento que estamos em terreno daquela saga tão popular. De resto, poderia ser um mediano filme de ação de ficção científica. Com bandidos que andam em naves e roubam um líquido qualquer de nome esquisito, mas longe de um tempo de lei seca… Tem valores como cinema de ação. Mas, como coisa do universo Star Wars, tem algo de postiço. E forçado… A força faltou por estes lados…
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