Está na hora de conhecer Sevdaliza
Texto: NUNO GALOPIM
Apesar de ter já uma série de EP editados desde 2012 e de ter apresentado em 2017 um dos mais surpreendentes álbuns de estreia do ano (ISON, lançado pela Twisted Elegance e com edição em vinil duplo pela Music on Vinyl), Sevdaliza pode ser ainda para muitos um segredo a desvendar urgentemente. E porquê? Porque na sua encruzilhada de ideias e sensações correm afinidades com algumas das mais cativantes e desafiantes figuras da criação musical do nosso tempo. Imaginem um universo herdeiro da geometria rítmica narcotizada, lenta, de uns Portishead, que concebe uma relação entre o som e o silêncio que tem um dos paradigmas atuais em Arca e, depois, uma relação com outros instrumentos (nomeadamente as cordas) que estabelecem eventuais relações com o trabalho de uma Björk e têm desde logo aqui três razões para despertar a curiosidade.
Porém Sedvaliza não nasce de uma mera soma de referências bem escolhidas, mas antes da assimilação destas pistas segundo uma identidade que não esconde a sua ascendência iraniana (apesar de ser holandesa) e uma voz com personalidade que se demarca, apesar de afinidades eventuais com terrenos R&B, das linhas mais em voga no canto do presente.
ISON, como ponto para o qual confluíram as experiências e ideias dos EP anteriores, foi um monumento que talvez pecasse apenas por ser longo na extensão do volume de música gravada. Mas desde logo deixava clara a afirmação de um conjunto de ideias que colocavam Sevdaliza na linha da frente de uma nova geração de estetas da canção, procurando novas formas no cruzamento de linguagens e ferramentas.
Um ano depois The Calling (um EP com sete faias e 30 minutos de música, ou seja, quase um LP) parte das mesmas coordenadas para alcançar um patamar ainda mais trabalhado das mesmas ideias. Uma vez mais fica clara a importância da demanda pelo som (das eletrónicas à clareza das cordas), afinal aqui tão determinante na criação da canção quanto a própria composição e performance vocal. O alinhamento revela uma série de ideias em sintonia com as pistas já exploradas em ISON, juntando em Observer, a faixa final, um inesperado mergulho por linguagens mais próximas da pop. Síntese perfeita da visão que ISON fixou, The Calling é, assim, o melhor disco de Sevdaliza até hoje. E um dos melhores que vamos escutar este ano.
“The Calling”, de Sevdaliza, está disponível nas plataformas digitais numa edição da Twisted Elegance. Uma edição em vinil limitada a 2000 exemplares numerados foi lançada pela Musico n Vinyl por ocasião do Record Store Day. ★★★★★
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