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Pelas salas do Louvre, como se fosse num sonho

Texto: NUNO GALOPIM

Nascido de um desafio lançado pelo próprio museu parisiense a vários autores, “Os Guardiões do Louvre” é mais um título do mestre japonês Jiro Taniguchi a conhecer edição entre nós.

Autor com uma longa relação com França e a banda desenhada franco-belga, o japonês Jiro Taniguchi (1947-1917) foi, juntamente com outros como Bilal, Étienne Davodeau ou Niocolas de Crécy, um dos nomes que o Museu do Louvre chamou em 2013 para um desafio de criação de obras que tivessem esta grande instituição parisiense como protagonista ou cenário. Depois de ter passado um mês a deambular pelas salas do museu – certamente como o fazem muitas das personagens dos seus livros, caminhando e observando – o mestre japonês criou Os Guardiões do Louvre, aquele que seria, de resto, o seu último livro “francês”.

Se o museu é aqui uma entidade física real e o protagonista – um autor japonês que, após um festival em Barcelona, resolve passar uns dias em Paris antes de regressar a casa – uma projeção de um alter ego do próprio Taniguchi, já o que descobrimos entre as páginas de Os Guardiões do Louvre é uma deambulação entre o sonho e a realidade, o presente e o passado, aquele lugar e outros onde a mente leva a personagem que encontramos, logo nas primeiras páginas, tolhido em febre numa cama de hotel.

Uma noite de sono deixa-o acordar com outro alento e, na manhã seguinte resolve visitar o Louvre. Porém, depois de enfrentar as multidões no hall e corredores, a dada altura dá por si atordoado, despertando numa outra galeria do museu… aparentemente sem ninguém a não ser ele mesmo… e uma figura que de apresenta como uma das guardiãs do local e que revela não ser nem mais nem menos do que a Vitória de Samotrácia (uma das mais icónicas obras ali expostas).

Esse será o primeiro de uma série de encontros entre o que parece ser um mundo de sonhos e o da realidade, num limbo que faz o protagonista vaguear entre épocas diferentes e até mesmo lugares, chegando a conhecer figuras como as dos pintores Jean-Baptiste Corot ou Vincent Van Gogh (este numa viagem a Auvers-Sur-Oise) e a assistir, presencialmente, à evacuação das obras do museu em vésperas da eclosão da II Guerra Mundial, numa ocasião em que vê, caminhando pelas salas, o escritor Antoine de Saint-Exupéry…



A deambulação, tão característica nas situações criadas por Jiro Taniguchi, as reflexões, os encontros (aqui mais no plano onírico do que nos arcos do quotidiano mais frequentes nos seus livros), desenham uma narrativa que não procura bem a construção de uma trama empolgante nem um panorama visual pelas salas que visitamos. Minimalista, mais no plano das sensações, das memórias e referências, a narrativa é suave e bela… E não se procura nunca explicar nem justificar… Será tudo o que aqui sucedeu uma mera construção criada pela febre alta que atormenta o protagonismo? Será mesmo verdade?… Nada como caminhar entre as páginas e deixar a cada um o espaço para a resposta. Ou nem por isso…

O livro, como os demais desta série de títulos encomendados pelo museu, junta à história do Louvre uma dimensão de fantasia e encantamento que o cinema também já por diversas vezes visitou, seja numa cena mítica de Bande à Part (1964) de Godard (depois citada em Os Sonhadores de Bertolucci) ou no mais recente Frantz, de Ozon. Porque um museu pode ser também uma casa de sonhos.

“Os Guardiões do Louvre”, de Jiro Taniguchi, é uma edição de 144 páginas em capa dura pela Levoir. O livro é apresentado segundo a ordem de leitura japonesa (de trás para a frente) e inclui textos complementares que contextualizam a obra e oferecem informação adicional sobre alguns dos nomes que a narrativa refere.

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