Três canções nos 130 anos de Fernando Pessoa
Texto: NUNO GALOPIM
Nasceu a 13 de junho de 1888, passavam cerca de 20 minutos das três da tarde, no 4º direito do número quatro do Largo de São Carlos, em Lisboa. Faz hoje 130 anos. Vulto maior da cultura portuguesa, Fernando Pessoa é hoje um dos nossos mais universais embaixadores da palavra (e também das ideias). A música e os músicos reconhecem esse legado. Tanto que já ouvimos Fernando Pessoa declamado por Patti Smith ou cantado por Maria Bethânia. Foi abordado desde o fado às esferas do jazz e até mesmo tem lugar nos universos da música erudita: Salomé, ópera de Pedro Amaral, tem por base uma peça de teatro de Fernando Pessoa. Hoje, que se assinalam 130 anos sobre o seu nascimento, recordemos três canções que deram outras vidas e vozes a poemas seus:
“No Comboio Descendente”
José Afonso (1972)
Um dos nomes de referência da canção portuguesa (e um dos responsáveis maiores pela criação de uma música “moderna” no quadro da canção popular made in Portugal nos anos 60 a 80), José Afonso era também um brilhante letrista. Mas houve ocasiões em que levou à sua música palavras de grandes poetas portugueses. Assim o fez com Luís Vaz de Camões, com Manuel Alegre, com António Aleixo, com José Carlos Ary dos Santos. E, também, Fernando Pessoa. Aconteceu na alvorada dos anos 70 quando, no alinhamento do álbum Eu Vou Ser Como a Toupeira, incluiu No Comboio Descendente.
“Opiário”
Wordsong (2006)
O que o projeto Wordsong fez, nos dois discos editados na alvorada do século XXI, não correspondeu, exatamente, a clássica operação de dar novo corpo musical a poemas que nasceram sem existência necessariamente sonora. Al Berto e, depois, Fernando Pessoa, foram antes matéria prima da qual, através de processos de cirurgia num quadro de manipulação e fragmentação de elementos, nasceram canções. Canções que não traduziram obrigatoriamente uma lógica estrutural fixa, antes nascendo como afloramentos intuitivos que partiram da palavra e ganharam vida pelo som. Pessoa levou-os a uma aventura de descoberta, procurando os músicos os seus espaços de identificação no poeta. O projeto acrescentou a contribuição da imagem (num DVD), numa sucessão de telediscos de Rita Sá, com genética no universo da ilustração, reforçando as intenções de intervenção plástica de uma obra ousada que promoveu uma abordagem desafiante ao universo pessoano.
“A Day of Sun”
Alexander Search (2017)
A partir dos poemas de juventude de Fernando Pessoa, o pianista Júlio Resende concretizou um sonho de juventude e criou a sua banda pop/rock… Chamou-lhe Alexander Search. Salvador Sobral é ali o vocalista, embora na verdade todos os músicos vistam ali a pele de personagens. A ideia surgiu quando Júlio Resende comprou um livro com a poesia em língua inglesa de Fernando Pessoa. Eram poemas de juventude, com uma rebeldia muito particular, e escritos numa etapa em que (tal como as figuras da história de ficção que aqui se conta) viveu na África do Sul. O encontro com as palavras do jovem Pessoa levou o pianista a encarar um sonho de adolescência até aqui não concretizado: o de formar uma banda rock. E com este “argumento” em mãos criou a banda que, depois de muito pontuais discretas apresentações, editou um primeiro álbum em 2017.
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