Primeira gravação de David Bowie vendida por 44 mil euros
Texto: NUNO GALOPIM
Achada há pouco tempo, no cesto do pão da casa do avô do baterista da primeira banda na qual David Bowie militou, uma fita com aquela que deverá ser a sua mais antiga gravação como vocalista foi vendida esta semana num leilão por cerca de 44 mil euros, quatro vezes mais do que o inicialmente esperado. A fita data de 1963 e nela ouve-se David Jones (como então se apresentava, usando ainda o seu nome real) a cantar, com os Konrads, o tema I Never Dreamed. Esse é o único tema vocal registado nessa sessão na qual o grupo gravou ainda alguns instrumentais. Não foi revelado quem adquiriu a fita nem o que eventualmente fará desta gravação.
Poderá nascer daqui um disco dos Konrads? A acontecer será o terceiro, uma vez que o grupo, já depois de Bowie se ter afastado, editou em 1965 o single Baby It’s Too Late Now e, em 1996, um segundo e derradeiro 45 rotações com o tema I Didn’t Know How Much. Se I Never Dreamed chegar a single representará assim, apesar de editado no século XXI, a mais antiga gravação editada de Bowie, antecedendo Liza Jane, o single que fez a sua estreia discográfica em 1964, assinado como Davie Jones and the King Bees.
Os Konrads correspondem à etapa inicial da carreira de Bowie e antecedem o tempo que viveu co os King Bees. Na verdade o seu papel principal nos Konrads não era como vocalista, mas sim, saxofonista. O grupo nascera em 1961 e tinha como vocalista o seu amigo e colega de escola George Underwood. Bowie surge ali mais tarde já depois de em 1962, então com 15 anos, ter pedido ao pai um saxofone. E foi como saxofonista que se estreou com os Konrads, numa festa de escola a 16 de junho de 1962.
Data deste tempo em que integrou os Konrads o célebre episódio de pancadaria com George Underwood que valeu a Bowie uma lesão no olho esquerdo que gerou a diferença de cor que se tornaria depois uma marca visual do ícone pop que então nasceria.
A chegada de Bowie, por algum tempo, ao lugar de vocalista dos Kon-rads (como se passaam depois a chamar) surge depois de mudanças de formação pelas quais o grupo passa. Em outubro de 1962 entrou um novo baterista, Dave Hadfield e George Underwood, que era amigo do anterior, deixou bem claro que estava pouco satisfeito com a troca, afastando-se. A voz passava então para Roger Ferris que cantava acompanhado por duas coristas. Mas um novo momento de pancadaria levou o vocalista a abandonar a banda. Quem se segue?… David Jones.
Quando David assume as rédeas dos Kon-rads o grupo mudou o seu repertório e passou a tocar versões de temas como “Good Golly Miss Molly”, “Lucille” ou “Let’s Dance” (não confundir com o que Bowie depois criara, já que nestes dias o “Let’s Dance” que cantava era uma composição de Chris Montez). Atuavam sobretudo em salas de baile, salões de igreja, em clubes juvenis. Até que, em agosto de 1963, entraram pela primeira vez num estúdio para gravar uma maquete que tinha como finalidade a apresentação do grupo à editora Decca. Entre os temas gravados lá estava “I Never Dreamed”, uma canção com letra de David Jones e música composta pelo guitarrista Alan Doods.
Durante anos esta sessão era um episódio importante na mitologia de Bowie, embora sempre envolta em mistério já que, desde então, nunca mais ninguém ouvira estas gravações. Existiria mesmo? Estaria perdida? Alguma vez se poderiam escutar os Kon-rads nos tempos de Bowie? É que, dos Kon-rads, além dos dois singles editados, as restantes duas maquetes conhecidas são posteriores à presença de Bowie na banda. A sua descoberta permite resolver os mistérios e dúvidas. E convenhamos que não era coisa nem peculiar nem visionária. Sem surpresa, a editora deu-lhes um “não”. Bowie saíu pouco depois para formar, com George Underwood, os The Hooker Brothers, que estiveram juntos até novembro de 1963. Em 1964 voltou a formar uma banda: Davie Jones & The King Bees. E com eles surgiu o seu primeiro single.
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