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Not very Well(es) done…

Texto: NUNO CARVALHO

“Amar-me-ão Quando Eu Morrer”, de Morgan Neville, documentário da Netflix sobre o conturbado processo de criação de “O Outro Lado do Vento”, o derradeiro filme de Orson Welles, suscita sentimentos mistos. Se tem o mérito de procurar humanizar um colosso intimidante, fá-lo porém de uma forma sensacionalista e tabloidística.

Em “Amar-me-ão Quando Eu Morrer”, de Morgan Neville, o documentário da Netflix sobre o conturbado processo de criação de “O Outro Lado do Vento”, o derradeiro filme de Orson Welles, que ficou incompleto (com apenas 40 minutos montados) à data da sua morte, em 1985, e que só agora, graças ao esforço da plataforma de streaming, vê a luz do dia na forma integral, Oja Kodar, coargumentista e protagonista do filme-dentro-do-filme da mítica longa-metragem (e amante de Welles), diz do homem para quem representou um rejuvenescimento e uma renovada consciência da sexualidade: “Ele parecia-me um pouco ameaçador. Com a capa, ele era a personificação do próprio vento. Mas eu conhecia o outro lado deste vento. Porque o Orson era o vento capaz de nos acariciar, de nos elevar, de nos fazer dançar.” Sem dúvida que Orson Welles foi uma espécie de elemento da natureza, mais do que humano, e o que o documentário de Neville faz, de um modo que suscita porém sentimentos mistos, é procurar humanizar esse colosso intimidante, mas de uma forma essencialmente sensacionalista e tabloidística.

Não será de desvalorizar contudo a componente factual que “Amar-me-ão Quando Eu Morrer” possui, porque se trata de um filme bem documentado, recorrendo a um vasto manancial de material fílmico, que vai de excertos de “O Outro Lado do Vento” a imagens da rodagem e de arquivo ou a entrevistas televisivas. Quase meio século depois do início das filmagens do último e amaldiçoado filme de Orson Welles (que decorreram em várias fases entre 1970 e 1976), um exercício de inesperado experimentalismo estético e temático, e fruto do trabalho de uma equipa liderada pelo cineasta Peter Bogdanovich, pelos produtores Frank Marshall e Filip Jan Rymsza e pelo montador Bob Murawski, “O Outro Lado do Vento” pode ser apreciado na Netflix desde dia 2 deste mês.

E é da história desse projeto ousado (uma crítica à Hollywood que proscreveu Welles, sobretudo a partir de “A Sede do Mal”, mas também uma óbvia paródia de filmes europeus de arte e ensaio como o “Zabriskie Point” de Antonioni, com John Huston no papel de um realizador que dá uma festa para celebrar o seu 70º aniversário e exibir o seu último filme naquele que será também o seu último dia de vida) e do caos que o impediu de chegar a bom porto no devido tempo que trata “Amar-me-ão Quando Eu Morrer”, um complemento a “O Outro Lado do Vento” que abre o apetite para o filme (que merece ser visto) e que só é redimido do seu lado mais superficial pela forma tocante como (lá mais para o final) mostra Welles e a solidão dos seus últimos anos.

“Amar-me-ão Quando Eu Morrer”, de Morgan Neville, está disponível na Netflix

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