Super Bock em Stock (dia 1): o bom, o mau e o vilão
Texto: GONÇALO COTA
O bom. Nahkane sobe ao palco de uma Sala EDP cheia (Casa do Alentejo), de calças e blusão vermelho acetinado. Por baixo de um grande candelabro, para incentivar o dramatismo, a figura andrógina do sul-africano (algo entre Deborah Dyer, dos Skunk Anansie, e uma Grace Jones) move-se, entre as canções do seu “You Will Not Die”, de forma confiante, fluída, sedutora. Entre pequenas considerações sobre a sua identidade, a relação com o meio onde cresceu e o seu florescer – a génese do seu álbum -, canta-nos numa voz poderosa as canções de um dos melhores registos do ano. A sua tradução para palco é mais forte e espessa, com uma utilização de guitarras elétricas e sintetizadores que permitem encorpar mais as eletrónicas. Em contrapartida, nas baladas, tudo parece estar até ao osso. Exceto a voz: alienígena e teatral, entre Anohni, Benjamin Clementine e James Brown. Houve ainda espaço para uma versão incrível de Kill, do Seal. Ofereceu-nos um concerto libertador e catártico. Nahkane foi o claro vencedor da noite.
O mau. Natalie Prass, quase a fechar a noite, vem apresentar, ao Cinema de São Jorge, “The Future and The Past”, editado ainda ano. Acompanhada por uma banda onde todos vestiam macacões azuis, a americana, de vestido azul cintilante, não convenceu. E a razão é simples: a tradução das canções deste seu segundo longa-duração, para concerto, faz lembrar o som que escutamos naquelas típicas bandas de casamento. Ou de jantares de empresa. Ou de festas de finalista de secundário. Em conclusão: uma banda sem identidade e sem um som característico, totalmente banal, vulgar e sem mobilizadora de interesse. A diminuição de propriedades que funcionam muito bem em disco fez-se sentir durante todo o concerto. E, o exemplo máximo foi Short Court Style, um excelente single, que esmoreceu e soou desbotado. “Ships Go Down” foi o único momento eletrizante de um alinhamento que pecou pela falta de Sisters – e se o disco era, tal como tem dito em entrevistas, é resultado do seu estado no pós-eleição Trump, esta não poderia ter mesmo faltar.
O vilão. Ainda antes de Natalie Prass, Johnny Marr veio fazer a vontade aos fãs órfãos de The Smiths: cantar um conjunto de sucessos dos anos oitenta, substituindo em modo karaoke a voz de Morrissey (e nada daquilo lhe assenta); oferecer de forma alternada algumas canções de “Call The Comet” (o seu último longa-duração), que, apesar de ser o seu mais interessante trabalho a solo, é desinteressante e desimaginativo ao vivo; e tocar (e isso, sim, fá-lo muito bem) acordes de guitarra que fazem desempoeirar a memória da banda de Manchester. Ainda assim: o britânico é a apagado e teima, sozinho, em resgatar todo um imaginário. O Coliseu, a meio gás, viveu bem esse imaginário. Mas para quem não é “fanzoca” agarrado ao passado o resultado esperado seria desilusão. E não é que foi mesmo?
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