35 anos depois, Michel Vaillant regressa a Macau
Texto: NUNO GALOPIM
Lançada em 2012, a “nouvelle saison” de Michel Vaillant transportou o herói criado em 1957 por Jean Graton para a contemporaneidade, colocando-o não só perante novos contextos como ensaiando um modelo mais próximo do que é a ideia de arco narrativo de uma série televisiva do que o mais habitual na lógica clássica do álbum de BD no qual a cada aventura cabe o contar de uma história com princípio e fim, em comum havendo sobretudo as personagens e a sua mitologia.
A “nouvelle saison” de Michel Vaillant não deixa de tomar cada álbum como um espaço no qual uma trama é lançada e resolvida. Porém há uma narrativa maior que cruza os vários volumes, somando cada novo episódio novos factos e revelações sobre um arco narrativo maior iniciado em 2012 com “Em Nome do Filho” e que agora, sete álbuns depois, atinge a velocidade de cruzeiro.
A velocidade, os carros e as corridas continuam a habitar a medula dos acontecimentos. Mas à Vaillante como marca que obtém resultados em vários campeonatos junta-se agora uma dimensão empresarial que toma inclusivamente uma dimensão fulcral nas coordenadas dos acontecimentos quando um takeover hostil a tira das mãos da família que até aqui a criara e desenvolvera. “Rebelião”, o sexto “episódio”, tinha aprofundado a amplitude do drama da família Vaillant quando, tentando começar de novo, a equipa de Michel vence as 24 Horas de Le Mans mas acaba detido sob acusação de participação (o que na verdade sabíamos que não tinha acontecido) no acidente que ditara a morte do seu irmão.
“Macau”, o sétimo “episódio” começa por explorar o conflito entre a mais jovem geração do clã Vaillant mas lança depois a narrativa rumo ao Grande Prémio de Macau em Fórmula 3, uma corrida para apenas jovens pilotos e que é descrita como uma prova que distingue os verdadeiramente capazes dadas as dificuldades que o exigente Circuito da Guia coloca a quem ali corre.
Não é a primeira vez que Michel Vaillant está em Macau. É verdade… Trata-se de um regresso, 35 anos depois de “Encontro em Macau”, mas sob uma trama bem diferente… Diferentes são também os tempos, correspondendo esta aventura a uma tentativa de aposta no mercado asiático já que este livro tem distribuição em Macau, Hong Kong e China.
O episódio, que sugere um flirt da série aos universos das pistas de automóveis, não escondendo um interesse a médio prazo num regresso à Fórmula 1, recorre a uma estratégia que Jean Graton tantas vezes usou em histórias que cruzavam o mundo da ficção com a realidade. E aqui essa ligação faz-se no apadrinhar de uma jovem esperança da Fórmula 3, o franco-argentino Sacha Fenestraz (de apenas 19 anos), campeão da Fórmula Renault Eurocup em 2017 e 11º classificado no Campeonato Europeu de Fórmula 3 em 2018. Curiosamente foi o 3º classificado no GP de Macau em 2018…
A presença da realidade neste volume da “novelle saison” em que o quarteto autoral se vê reduzido a um trio – com textos de Philippe Graton e Denis Lapière e desenhos de Benjamin Béneteau – não se escota no jovem piloto Sacha Fenestraz. Steve Warson, companheiro de equipa de Michel Vaillant em aventuras de outros tempos, é agora um político e candidata-se, pelo Partido Democrático, a um lugar no Senado pelo Texas, tendo como rival o republicano Ted Cruz. Um Beto O’Rourke, portanto… Mas talvez com melhor aceleração…
No plano da ficção junta-se ainda à velocidade dos carros em pista uma sequência de perseguição nas ruas de Macau que qualquer filme de ação gostaria de chamar às suas imagens…
Se nas imagens a história parece seguir, sem rasgo ou ousadia maior, os trilhos dos álbuns recentes, na narrativa “Macau” dá razão a quem resolveu não repetir os modelos de outrora na hora de dar nova vida a Michel Vaillant depois do desaparecimento do seu criador. Jean Graton ficaria satisfeito…
“Macau”, volume 7 da ‘nova série’ de Michel Vaillant, tem argumento de Philippe Graton e Denis Lapière e desenhos de Benjamin Béneteau. A edição portuguesa, com tradução de Ana Cristina Gonçalves, é um volume de 54 páginas em capa dura com edição da ASA.
PS. No GP de Macau deste ano o piloto Sacha Fenestraz correu com as cores da Vaillante no seu carro!
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