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Um retrato da primeira sessão dos Bauhaus

Texto: NUNO GALOPIM

Um EP assinala os quarenta anos da sessão de gravação que levou os Bauhaus pela primeira vez a um estúdio, apenas seis semanas depois de a banda ter nascido. “Bela Lugosi’s Dead” surgia ali. Mas há neste EP outros momentos que ajudam a fazer o retrato de uma banda a descobrir qual seria a sua identidade.

A 26 de janeiro de 1979, umas meras seis semanas depois de a banda ter sido formada, os Bauhaus marcavam uma primeira sessão de estúdio. Um pequeno estúdio local, em Wellingborough, gerido por Derek Tompkins, então com 55 anos e já larga experiência a gravar todo o tipo de bandas desde os anos 60… Mal imaginavam então que essa sua capacidade em lidar com uma invulgar variedade de sonoridades seria uma das chaves para chegarem à visão que acabaria por definir a canção que não só encetaria a sua discografia como seria determinante para o moldar de uma visão sombria mas pungente que pouco depois seria conhecida como rock gótico…

A principal peça que levaram a esta sessão era uma canção diferente. Era mais uma construção ambiental, longa, repetitiva, que traduzia um interesse contemporâneo de David J e Daniel Ash pelos universos da música jamaicana (que de resto se notaria em “Harry”, outra das canções que gravaram nessa mesma sessão. A peça mais longa não era mais nem menos do que “Bela Lugosi’s Dead”, para a qual em ensaios já tinham talhado experiências com eco na bateria… A experiência de Derek Tompkins com bandas de reggae permitiu aos Bauhaus criar ali uma incursão pelos territórios do dub que acabaria por conferir a última contribuição para o desenho da identidade da canção que, sete meses depois, seria editada como single de estreia da banda, cativando atenções (entre as quais a da 4AD Records que os assinou para logo depois gravarem um álbum de estreia).

Além de “Bela Lugosi’s Dead”, que nasceu com a forma que conhecemos nesta sessão, as gravações naquele dia de janeiro de 1979 deram primeira forma a “Boys”, uma canção que na verdade seria, do lote gravado, a que mais se aproximou do que seria o caminho futuro da banda. Uma abordagem minimalista à guitarra, uma solidez estrutural na relação do baixo e da bateria na construção da arquitetura rítmica. E uma pose vocal com uma teatralidade que tanto herda lições de Bowie como das primeiras experiências a solo de Brian Eno… Uma das melhores canções da etapa inicial da vida dos Bauhaus, “Boys” seria pouco depois regravada em estúdio, dessa segunda sessão surgindo a versão que depois seria usada no lado B de “Bela Lugosi’s Dead”… Falta aqui referir a capa que, fixando uma obsessão que os quatro músicos então tinham pelos primórdios do cinema, se revelaria igualmente determinante na construção do ideário estético do rock gótico.

O disco que agora surge – a tempo de assinalar os 40 anos desta sessão de gravação – recolhe os temas que os Bauhaus gravaram naquela ocasião. E por isso a “Bela Lugosi’s Dead” e à primeira abordagem (mas já muito próxima da definitiva) de “Boys” o EP que agora surge com o título “The Bela Session” junta outras três canções que dão a entender como, e sem surpresa, às seis semanas de vida havia ainda uma noção pouco afinada do que seria a identidade da banda. “Some Faces”, um inédito, na verdade soa mais a caminhos que os Love & Rockets tomariam anos mais tarde e revela uma costela rock’n’roll ainda sem a capacidade de afirmar uma região demarcada do espetro que os Bauhaus encontrariam meses depois quando criaram “In The Flat Field”, o seu álbum de estreia. “Harry” é uma primeira abordagem a uma canção que depois surgiria num lado B de 1982. E “Bite My Hip”, ainda sob linhas rock’n’roll pouco características, corresponde à ideia inicial de uma canção que evolveria depois para ganhar a forma de “Lagartija Nick”. Em conjunto o lote dá-nos o primeiro retrato gravado dos Bauhaus. E para quem tinha seis semanas de trabalho conjunto convenhamos que havia já aqui sinais claros de caminhos a seguir. E felizmente tomaram as opções corretas perante as possibilidades que ali se levantavam. Caso contrário, 40 anos depois, estas gravações seriam bobine esquecida entre as muitas que certamente daquele mesmo estúdio terão saído.

“The Bela Session” dos Bauhaus está disponível num EP em vinil, CD e nas plataformas digitais numa edição da Leaving Records.

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