Nove canções para quem não vive a correr contra o tempo
Texto: NUNO GALOPIM
Passam já treze anos sobre o momento em que, depois da súbita morte de Grant McLennan, o seu velho companheiro Robert Forster anunciou que os Go-Betweens deixavam definitivamente de existir. Naturais de Brisbane (Austrália), tinham surgido em finais dos anos 70 e, sobretudo depois de estabelecida uma ponte de trabalho com Londres, fizeram da sua obra em disco uma peça importante para contar grandes episódios da história pop/rock alternativa dos oitentas, inscrevendo na história a dupla criativa então criada por Forster e McLennan. Separados desde 1989, os Go-Betweens tiveram uma segunda vida entre 2000 e 2006 reduzidos precisamente à sua dupla central. Por essa altura tanto Forster como McLennan tinham já editado discos a solo. Robert Forster continuou, mas alargou substancialmente a sua atenção a outros espaços profissionais, entre os quais a escrita – tem trabalho como crítico musical desde há alguns anos e editou recentemente a autobiografia “Grant and I”. Confessa, contudo, ter um ritmo lento na escrita de canções. Diz habitualmente que consegue compor duas ou três por ano, daquelas que sente que pode depois registar em disco. E, de facto, desde o fim da segunda vida dos Go Betweens, editou apenas os álbuns “The Evangelist” (2008) e “Songs To Play” (2015), representando o novo “Inferno” o sétimo disco que lança desde que, em 1990, iniciou uma discografia a solo. E basta cruzar por uma vez as nove canções do alinhamento do novo disco para reconhecer que os critérios de exigência são afinal consequentes. Porque em “Inferno” vamos certamente encontrar uma das melhores coleções de novas canções que vamos escutar em 2019.
Com as nove canções no bolso, Robert Forster saiu de Brisbane e rumou a Berlim na companhia de um pequeno grupo, entre o qual está a sua mulher, Karin Baumler, que conheceu quando gravou, também em Berlim, o seu álbum de estreia “Danger in The Past”, em 1990. Há, curiosamente, mais reencontros neste disco já que o produtor Victor Van Vugt trabalhou como engenheiro de som nesse mesmo outro disco de 1990. Mas, de resto, não é do passado que aqui se fala.
Plenas de marcas de identidade – que o registo entre o canto e a fala de Fosrter sublinha – as canções surgem num corpo alinhado com toda a história do autor, não esquecendo até os ecos dos Velvet Underground que tantas vezes escutámos nos Go Betweens. Escute-se “Remain” e note-se que há marcas resistentes que o tempo nunca apaga. “Inferno” apresenta esta e oito mais canções delicadamente compostas a pensar nas palavras, na voz, na guitarra e em arranjos que podem não olhar para caminhos novos na música, mas que traduzem, mesmo assim, um novo e franco entusiasmo. Observações, reflexões, habitam um disco que escapa assim às vertigens de quem prefere viver os limites do presente. E que sabe bem ouvir.
“Inferno”, de Robert Forster, está disponível em LP, CD e nas plataformas digitais numa edição da Tapete
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