Pet Shop Boys: uma (grande) noite na ópera
Texto: NUNO GALOPIM
Só ao fim de cinco anos de discos, e então já com uma mão-cheia de êxitos de escala global, os Pet Shop Boys resolveram experimentar o palco. E quando finalmente o fizeram deixaram claro que a apresentação das canções ao vivo era parte de um conceito que envolvia tanto a criação de imagens (nesse caso eram fimes de Derek Jarman) como a possibilidade de uma construção narrativa. Neste último aspeto foram ainda mais longe num segundo espetáculo – ao qual chamaram “Performance” no qual a sucessão de canções e proposta cénica que as alinhava em palco mais parecia coisa de dimensão operática do que as rotinas mais comuns em espaços da música pop… No fundo estavam já aí (e estamos a evocar memórias de finais dos anos 80 e inícios dos anos 90) marcas de uma mesma identidade que, em 2018, ao levá-los ao espaço da Roya Opera House – a principal sala de ópera londrina – os fez sentirem-se, afinal, em casa.
Ali viveram durante quatro noites consecutivas, de 20 a 23 de julho de 2016 (tendo repetido mais tarde a mesma residência, uma vez mais em quatro noites, em julho de 2018). Tinham recentemente editado “Super”, a segunda parte de um díptico intenso e cunhado pela força da música de dança (escola electro) criado em colaboração com o produtor Stuart Price (o mesmo de “Confessions on a Dance Floor” de Madonna). E não só as marcas de identidade das parcerias com o produtor dominaram a construção da abordagem musical como foram buscar a um dos temas do álbum – “Inner Sanctum” – o título para o espetáculo. Não era apenas um momento da Super Tour. Este era um alinhamento especial… E de facto o que a caixa quádrupla (2CD, DVD e Blu-Ray) agora nos mostra é o retrato de um acontecimento cenicamente sofisticado e musicalmente coerente que em nada escapa ao mesmo código genético que em tempos definira “Performance”. O tempo juntou mais canções, novas ideias, solidez e um claro domínio sobre as artes do palco.
“Inner Sanctum” não é uma viagem de nostalgia, como acontece em alinhamentos de concertos de alguns companheiros de geração dos Pet Shop Boys. Há uma clara afirmação de um presente ativo quer pelas novas canções quer pela forma como a identidade sonora da obra recente dos Pet Shop Boys molda abordagens a velhas canções, como “Home and Dry” ou “Left To My Own Devices”. Há inevitáveis grandes clássicos. Mas também memórias importantes, embora de menor dimensão como êxitos globais, que visitam temas dos primeiros tempos como “Opportunities (Let’s Make Lots of Money)”, “In The Night” ou “Love Comes Quickly”.
O concerto assenta sob a construção de uma narrativa que valoriza a criação de vários momentos de surpresa e revela gradualmente a artilharia de palco e a própria infantaria depois chamada para um natural final apoteótico. Do trabalho inicial centrado nos dois músicos e em jogos de luz e vídeo à presença em cena de mais músicos e de dançarinos (que lembram o “papão” do “Nightmare Before Christmas” de Tim Burton, mas em cores pop) o caminho faz-se de somas, de inclusão. Não há solos de guitarra. Não há divas em agudos arrebatadores. Mas há um grande concerto. E sim… de música pop.
Como extra é incluído no Blu-Ray a gravação da atuação do grupo no Rock In Rio (do Rio de Janeiro) integrada na Super Tour… Sem surpresa o alinhamento é encurtado, como acontece em tantos ‘slots’ de festivais… Mas perante a mega-plateia esvai-se a intensidade e envolvência que o trabalho de luz estabelece entre quem assiste e quem está no palco. Se querem ter um bom exemplo do que se ganha e perde entre uma atuação em sala e um concerto em festival, este “Inner Sanctum” pode dar respostas. Cada um tire, depois, a sua conclusão. Porque não temos de pensar todos da mesma maneira.
“Inner Sanctum”, dos Pet Shop Boys, está disponível num pack com 2CD + DVD + Blu-Ray, numa edição da X2.
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