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Texto: NUNO GALOPIM

No documentário “O Admirável Mundo em Rede” seguimos a curiosidade de Herzog sobre as origens e as possibilidades lançadas pela internet, desde os mais entusiasmantes sonhos da tecnologia até às mais assombradas consequências que a vida online também abriu.

De onde vimos? Para onde vamos?… É um pouco entre estas grandes questões fundamentais que Werner Herzog lança a sua curiosidade sobre a internet naquele que é o seu segundo documentário estreado este ano e que chega aos ecrãs de cinema poucas semanas depois de ter sido apresentado, via Netflix, outro filme seu, esse sobre… vulcões. Tal como ali procurava um ponto de vista pessoal sobre o universo sobre o qual centrava a sua atenção – e mais do que preocupado com os tipos de lava, as formas dos cones e das escoadas ou as técnicas de monitorização hoje usadas para vigiar vulcões ativos, ali procurava sobretudo como as populações em redor tinham associado uma carga mística a todos aqueles lugares – Herzog mostra também aqui uma vontade em não fazer nem uma entrada de Wikipedia com o era-uma-vez da internet nem estabelecer um mapa dos problemas e desafios que o mundo online hoje nos coloca pela frente. Nada disso. Apesar de não deixar de conversar com figuras e figurões de referência (e não falta uma entrevista com o cada vez mais omnipresente Elon Musk), esta é a internet, segundo a curiosidade de Herzog. E o fator humano volta a ter um peso maior do que o tecnológico, já que é entre a sede da descoberta e a crença no conhecimento e, como contraste, entre exemplos de vícios e medos entretanto estabelecidos pelas possibilidades que a vida online nos trouxe que tece um quadro que, mais do que fazer uma análise e tirar conclusões, parece antes querer lançar a reflexão em todos nós que usamos a internet.

O documentário, que segue o estilo já tão característico destas viagens pela curiosidade insaciável do realizador (e não falta nem o seu inglês de sotaque tão característico nem um certo pessimismo que por vezes transparece da forma como lança as questões, até mesmo quando recorre ao humor), começa por nos levar à sala onde tudo começou, na UCLA, onde uma primeira mensagem foi enviada, em 1969, de um computador que ali estava para um outro, bem longe. Quem lá estava conta como foi… E é quase como se pudéssemos escutar um homem da idade da pedra a explicar-nos como, talhando um pedaço de sílex, conseguiu fazer uma faca! Que corta e tudo!… Dali caminhamos depois por vários quadros que nos trazem ao presente, por vezes tentando espreitar o futuro, como, por exemplo quando se fala de robótica e inteligência artificial. Poderá a internet ser veículo de sonhos? Poderão as máquinas sonhar? Philip K. Dick, como nos lembra o filme, já o fez em Do Androids Dream of Electric Sheep?, o conto que inspirou Blade Runner.

Herzog vai a dada altura buscar o clássico cartoon publicado na New Yorker que nos diz que, na internet, poderemos, sem saber, estar a falar com um cão. Convenhamos que a ideia do desenho até teve graça. Mas quem o fez não tem cão. Porque se tivesse saberia que, estivesse um cão do outro lado, a enviar mensagens, a conversa seria invariavelmente sobre… comida.

Os mais surpreendentes episódios que o filme narra têm a ver com os vícios que a internet pode gerar, acabando por ter uma expressão sobre os comportamentos. Ou com efeitos secundários que pode causar em algumas pessoas mais sensíveis, como o efeito da radiação que provém das redes wi fi, escutando o filme uma comunidade que encontrou a paz no meio do campo, num lugar sem redes. É bom parar, ver, ouvir e pensar um pouco sobre algo que, de tão presente nas nossas vidas, quase nem passa pelas nossas preocupações. E, como Herzog deixa claro, devia passar.

“Eis o Admirável Mundo em Rede”
Realização: Werner Herzog
Distribuição: Bold

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