Que histórias pode esconder uma ilha?
Texto: NUNO GALOPIM
O segundo volume de uma nova série de edições de novelas gráficas pela Levoir propõe-nos um reencontro com o galego Miguelanxo Prado, de quem esta mesma coleção já antes apresentou o pungente Presas Fáceis, história que caminhava entre as consequências de um esquema fraudulento que extorquira as poupanças a idosos.
O novo lançamento, Traço de Giz, apresenta-nos contudo uma narrativa nos antípodas do realismo que habitava a trama desse de Presas Fáceis, que foi inclusivamente premiado em 2016 como Melhor Álbum Estrangeiro na Amadora BD. Mais poético, algo surreal atém Traço de Giz (que é a obra mais premiada de sempre da BD espanhola) é uma história “marinha”, que nos transporta a uma ilha algures em lado nenhum.
Uma ilhota mínima, daquelas que nem nos mapas encontramos, habitada apenas por um farol que não funciona e uma estalagem, tendo como população permanente apenas duas pessoas: a estalajadeira e o seu estranho filho.
O traço com personalidade de Miguelanxo Prado e um trabalho notável no uso da cor desenham aqui uma narrativa que inclui claras homenagens a Hugo Pratt e a Borges e acompanha a errância de um marinheiro que dá com uma ilhota desconhecida, nela encontrando, além dos seus dois habitantes em permanência, uma outra viajante.
Os jogos de encontros e desencontros, pelos quais se cruzam outros mais que passam por aquele pedaço mínimo de terra definem uma história que tem tanto de sedutora como de absurda e que sugere um diálogo poético entre imagens e narrativa, naquele que é já, certamente, um dos títulos do ano no panorama nacional da edição de BD.
Esta presente edição inclui uma nota introdutória por Pedro Cleto e uma secção de “material adicional” que sugere uma ideia de viagem aos bastidores da criação do livro, mostrando planos dos barcos e da ilha, estudos de enquadramentos, planificação de algumas pranchas, estudos sobre as personagens, esboços e imagens alternativas de capa.
“Traço de Giz”, de Miguelanxo Prado, com tradução de Carlos Xavier, é uma edição de 104 páginas, em capa dura, pela Levoir.
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